10 fevereiro 2013

Dezesseis milhões de chinesas têm marido gay


Uma pesquisa feita no ano passado por Zhang Beichuna, professor da Universidade de Qingdao, que estudou a homossexualidade na China desde a década de 1980, estima que o país tem cerca de 50 milhões de homens e mulheres gays com idades entre 15 e 60 anos e que aproximadamente 16 milhões de mulheres estão casadas com homossexuais. A principal causa do fenômeno, apensar da modernização da sociedade chinesa, é a pressão social, a necessidade de atender tradições e a expectativa dos familiares. Por isso, nos últimos anos, os pedidos de anulação de verdadeiros casamentos de fachada só fazem crescer.

- Muitos gays se envolvem em casamentos com heterossexuais para atender às pressões sociais - em especial de seus pais -, mas continuam mantendo relações homossexuais fora do casamento - revela Xu Bin, presidente do grupo GLS Common Language, de Pequim.

De acordo com a tradição cultural chinesa, os jovens devem se casar por volta dos 25 anos e gerar filhos para dar continuidade à linhagem familiar. Além de ser um dos pilares sociais mais importantes do país, o casamento é visto como uma garantia de segurança financeira e emocional para muitos idosos, que dependem financeiramente dos filhos para sobreviver, o que acontece em razão da precariedade do sistema previdenciário chinês.

O único sinal de efetiva modernidade, ainda segundo o estudo da Universidade de Qingdao, vem sendo o aumento dos pedidos de divórcio ou anulação do casamento fundados na descoberta de parceiros homossexuais, o que demonstra que as jovens esposas não aceitam o casamento de fachada. Mesmo quando isso acontece, a pressão social ainda existe. Por isso, de acordo com Xu Bin, boa parte das mulheres buscam a anulação do vínculo matrimonial ao invés do divórcio.

- O pedido de anulação mostra que as mulheres entendem que ser divorciada diminui seu valor na sociedade - explica a ativista.

Ying, uma jovem mulher de 32 anos residente em Pequim, entrou com um pedido de divórcio em face do marido no fim do ano passado. Casada a cerca de um ano e sem manter relações sexuais, ela descobriu que o parceiro era homossexual.

- Ele chegou a pedir para que ficássemos ainda casados e tivéssemos filhos, para que a família dele não fosse prejudicada. Mas eu não podia viver assim - contou Ying.

Mas o problema não atinge apenas as mulheres. A situação inversa também é comum.

- Muitas chinesas se casam mesmo sabendo que são lésbicas. Mas elas não têm coragem de assumir sua posição perante a família e acabam seguindo a tradição, ainda que mantenham relações e namoradas fora do casamento - explica Xu Bin.

Situações deste tipo são comuns na comunidade GLS chinesa, mas acabam criando confrontos entre os gays mais velhos e os mais jovens. Nos fóruns de discussão na internet, por exemplo, lésbicas de gerações mais modernas (de 1990 em diante) criticam a posição adotada pelas mulheres das gerações mais antigas, que insistem em se manter casadas por temerem a pressão da sociedade. Visando contornar o problema, Xu Bin tenta criar encontros entre as gerações em conflito para a troca de experiência, já que, segundo ela "as jovens cresceram em uma China já mais aberta, e é difícil para elas entender que gerações mais velhas lidavam com preconceito de uma forma muito pior", o que não é difícil de se compreender quando se sabe que a relação homoafetiva foi considerada um crime até 1997 e uma doença mental até 2001. O preconceito contra as relações entre pessoas do mesmo sexo ainda é tão grande na China que nas zonas rurais é comum ver pais tentando "tratar" filhos gays através da medicina.

Casar ou não casar, eis a questão! Por isso, uma das saídas encontradas em cidades como Dalian e Xangai foi a criação de bailes dirigidos a homens e mulheres gays, que assim podem se conhecer e eventualmente armar um "casamento", podendo manter suas relações livremente fora do casamento sem a pressão do parceiro.

Um dos casos mais famosos de gays casados na China é o do artista plástico Xiyadie (seu nome artístico significa Borboleta da Sibéria). Aos 48 anos, ele já expôs seus trabalhos em Los Angeles e Estocolmo. Xiayadie se dedica ao jianzhi, a arte do corte de papel, que é um dos tesouros culturais chineses. A temática de sua obra, porém, é sua vida ao lado de seu companheiro de oito anos.

- A primeira vez que descobri ter sentimentos por meninos foi ainda criança, na escola. Eu achava que era doente, um cafajeste - conta o artista, que aos 24 anos cedeu às pressões familiares e se casou, após ter sido apresentado a dezenas de meninas pelos seus pais.

Somente há cerca de dez anos é que ele encontrou forças para enfrentar sua realidade. Apoiado por Yan'an, um especialista em jianzhi da província de Shanxi, o berço da arte milenar, Xiyadie mudou-se para Pequim, deixando para trás sua esposa e seus dois filhos.

Ele ainda não consegue viver apenas de sua arte, por isso mantém um trabalho regular num estúdio do cineasta Xiang Ting, em Songzhuang, leste da capital, onde trabalha como segurança, cozinheiro e zelador, ganhando 1,5 mil yuans mensais (R$ 490). À noite, em seu quarto de apenas dois metros quadrados, ele faz os seus recortes.

Perguntado sobre o que faria se pudesse voltar aos 24 anos e tivesse de escolher entre casar ou assumir sua orientação sexual, Xiyadie diz que mudaria pouco.

- Acho que fugiria dos meus pais. Voaria para longe para viver a minha vida. Não cederia a eles, mas também não contaria a verdade sobre mim.

A resposta de Xiyadie mostra toda a força que o preconceito ainda exerce sobre os gays, em todos os cantos do mundo. Você concorda? Deixe o seu comentário.









Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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