Rosemar foi diagnosticada com carcinoma de base de língua (foto: Fernanda Testa/G1) |
Se tudo funcionar como prevê a nova legislação, gente como Rosemar Rodrigues Barbosa, de 25 anos, não mais precisará enfrentar o verdadeiro calvário que ela teve que percorrer desde que começou a buscar a explicação para um pequeno problema na boca, que os primeiros médicos que a examinaram diagnosticaram como uma "afta".
Moradora de Vilhena - Rondônia - RO, ela foi obrigada a se descolar para Ribeirão Preto, em São Paulo - SP, para se internar no Hospital das Clínicas - HC, onde seu tratamento começou menos de 20 dias depois que a doença foi diagnosticada.
Rosemar sofre de um carcinoma de base de língua, que ataca a língua e a região do pescoço. A doença foi descoberta no dia 14 de fevereiro e o tratamento começou sete dias depois, no dia 21, mas sua caminhada até Ribeirão Preto, onde o diagnóstico aconteceu, foi árdua e dolorida.
- Tudo começou com uma afta, em outubro do ano passado. Eu estava em Vilhena ainda. Fui à farmácia, comprei remédios para fazer bochecho e a ferida sumiu. Mas depois voltou tudo de novo. Eu ia a vários médicos na rede pública, mas todos diziam que era só uma afta e me receitavam antibióticos - recorda a jovem.
Por três meses, de médico em médico, Rosemar não conseguiu resolver seu problema. Em janeiro deste ano, por exemplo, ela foi encaminhada a otorrinolaringologista.
- Fiz um tratamento no otorrino por 10 dias e não melhorou. Foi aí que ele disse que poderia ser um tumor. A ferida estava aumentando e a minha língua foi inchando. Eu tinha até dificuldade para falar - disse, lembrando que o médico foi quem solicitou que ela fizesse uma biópsia.
- Ele disse que iria viajar, e que quando ele voltasse era para eu passar por ele. Ele me encaminharia para internação caso fosse um tumor.
Mas um dia antes de fazer a biópsia, Rosemar foi encaminhada a um outro profissional, amigo de sua chefe.
- Esse médico era um dentista especializado em cirurgia de cabeça e pescoço. Ele disse que meu caso era muito sério e que eu não podia ficar em Vilhena. Ele me deu um encaminhamento para ir para o hospital. Fiquei três dias esperando uma vaga em Porto Velho, mas não consegui. Foi aí que ele me aconselhou a procurar outro lugar, porque em Porto Velho não havia nem previsão de fazer a biópsia - lembra ela com tristeza.
Mesmo sem a confirmação da doença, Rosemar chegou a pensar em buscar tratamento em Barretos - SP.
- Uma parente de uma amiga mora em Ribeirão, e eu consegui ficar hospedada na casa dessa mulher. Eu iria passar a noite em Ribeirão e ir para Barretos. Cheguei no dia 1º de fevereiro. Só que cheguei a Ribeirão muito mal, e já tive que ir a um pronto-socorro.
No dia 3 de fevereiro, ela passou mal novamente.
- Passei por três médicos, que me avaliaram e pediram minha internação no HC. Fui internada na segunda-feira, 4, fiz a biópsia, e no dia 14 de fevereiro constatou-se o câncer - conta Rosemar, explicando que depois da confirmação da doença, ainda passou por exames de ressonância na garganta para detectar se o câncer já havia afetado as cordas vocais.
No dia 21 de fevereiro, data da primeira consulta na oncologia, é que ela foi encaminhada para a quimioterapia.
- Eu estava muito debilitada. Naquele dia eu já fiz a primeira sessão. Não conseguia me alimentar, tiveram que colocar sonda - conta a moça, lembrando que após as três primeiras sessões de quimioterapia, começou a combinar o tratamento com radioterapia.
- Hoje me sinto muito bem. Desde a primeira sessão de quimioterapia eu estou bem melhor. Convivo com pessoas agora que passam pela mesma situação. Não tenho o que reclamar sobre o hospital. O atendimento é ótimo. Somos bem acolhidos em tudo. Tenho muito a agradecer a todo mundo que me ajudou em Ribeirão. Se eu ficasse lá (em Vilhena) mais tempo, eu não estaria mais aqui hoje - finaliza Rosemar, cheia de esperanças.
Como foi dito no início, o país está cheio de histórias tão ou mais dramáticas que a da jovem Rosemar. Se um terço de todo o dinheiro que escorre pelo ralo da corrupção política fosse redirecionado para a área da saúde pública, pessoas como ela e milhares de outras nas mesmas condições não precisariam sofrer tanto. Se a justiça fosse mais rápida e enfiasse na cadeia os criminosos que assaltam o erário público, as chances de Rosemar e de outros necessitados conseguirem um tratamento mais humano e digno aumentaria milhões de vezes. Por enquanto, resta torcer pelo atendimento do SUS, como determina a lei que hoje entra vigor. Tomara que dê certo e que Rosemar seja apenas uma das últimas lembranças do verdadeiro coma em que se encontra a saúde pública do nosso país.
Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral. |