16 abril 2014

Será que não temos um pouco de culpa na morte do pequeno Bernardo?

Bernardo Uglione Boldrini (foto: reprodução)

O caso do menino Bernardo Uglione Boldrini, de apenas 11 anos, que a polícia gaúcha encontrou enterrado em um matagal, na beira de um rio no interior de Frederico Westphalen, no Norte do Rio Grande do Sul - RS, chocou todo o país, além, é claro, dos moradores e autoridades da cidade de Três Passos, onde ele morava com o pai e a madrasta depois que sua mãe, Odelaine Uglione, segundo a polícia, suicidou-se. O menino se queixava de abandono familiar, e de acordo com a delegada Caroline Virginia Bamberg, responsável pela investigação, chegou a procurar o Judiciário para tentar morar com outra família. De acordo com a polícia, ele foi morto com uma injeção letal. Ainda não há muitos detalhes, já que o caso está sob segredo de Justiça, mas já se sabe que uma mulher, amiga de Graciele Ugolini Boldrini, a madrasta de de Bernardo, foi quem relatou à polícia onde o corpo do garoto foi enterrado, o que reforça a ideia do envolvimento dela, do pai do garoto, Leandro Boldrini, e de Edelvania Wirganovicz, a amiga de Graciele, no crime. 

- A não revelação de dados por enquanto é fundamental para o sucesso da investigação. Temos muitos elementos, mas precisamos coletar mais provas para deixar o caso bem esclarecido. Precisamos identificar o que cada um fez para a condenação - afirmou a delegada.

Os três foram presos preventivamente junto com a amiga por suspeita de crime. A causa da morte de Bernardo, como já disse, teria sido uma injeção letal, o que ainda depende de um laudo pericial mais completo, apesar de exames iniciais já terem detectado a existência, no corpo do menino, de um anestésico utilizado na clínica do pai, como informa o portal InFoco.

Ainda que o resultado da necropsia não tenha sido divulgado, o delegado Mário Wagner explicou que a madrasta de Bernardo teria praticado o crime com o auxílio da amiga. Ele ainda confirmou o uso de barbitúricos, uma espécie de sedativo, e uma injeção letal, com uma substância ainda desconhecida da polícia. 

- A certeza que nós temos é que foi um crime doloso cometido pela atual companheira do pai e com a ajuda da amiga dela - afirmou o policial.

Jussara Uglione, de 73 anos, avó materna do menino, afirma que ele era maltratado pela madrasta.

- O menino sofria maus-tratos. Ela não deixava ele entrar em casa enquanto o pai não chegasse. O menino ficava sentadinho na calçada. A justiça sabia disso porque toda a vizinhança via ele sentado na calçada - disse Jussara, que vive em Santa Maria, na região central do Rio Grande do Sul.

De acordo com Jussara, o pai e a madrasta não permitiam que ela visitasse o garoto desde o suicídio de Odelaine, sua filha e mãe biológica da criança, ocorrido em 2010, o que a fez recorrer ao Judiciário, que negou o seu pedido.

- Procurei a justiça. Eu queria visitar o meu neto e ele disse que eu era uma pessoa velha e não tinha condições, que era doente e não tinha condições de conviver com meu neto porque eu poderia morrer e deixar o menino traumatizado - conta Jussara, que relata ter dúvidas sobre a morte da filha, que morreu com um tiro na cabeça no consultório onde Leandro, o pai do garoto, trabalhava.

Leandro Boldrini e Graciele Ugolini Boldrini (foto: reprodução)

Dinamária Maciel, promotora da Infância e Juventude de Três Passos, confirmou a versão de que Bernardo procurou a justiça e fez um pedido para morar com outra família, o que gerou um procedimento investigativo por negligência afetiva e abandono familiar, não acatado pelo Judiciário local, que decidiu manter a guarda do garoto com o pai.

- Ele estava em situação de negligência afetiva pelo abandono familiar, mas garantiu que jamais sofreu agressões físicas - explicou a promotora, acrescentando que pediu “que ele indicasse duas pessoas com quem ele queria morar" mas elas não compareceram, alegando "que não queriam se incomodar e se envolver”.

O juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Três Passos, Fernando Vieira dos Santos, que agora se diz abalado e comovido com o trágico desfecho do caso, ressaltou que ao priorizar a reinserção dos vínculos familiares, como previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, adotou a providência padrão, o que o levou a não acatar a iniciativa do Ministério Público e autorizar que Bernardo continuasse morando com o pai.

 - O Bernardo foi enganado. E eu me senti enganado. Assim como ele eu não sabia que ele estava sendo levado para Frederico Westphalen - disse o magistrado.

História triste, não? Imaginem a agonia do garoto, abandonado afetivamente pelo pai e deixado nas mãos da madrasta, que sequer permitia que ele entrasse em casa. E a comunidade, que a tudo assistiu e nada fez? E as pessoas com quem ele disse que queria morar e que sequer atenderam ao chamado da justiça porque "não queriam se incomodar e se envolver”. E a própria justiça, como pôde ser tão cega aos apelos da criança e de sua avó materna? Por que tantos detalhes jurídico/burocráticos em alguns casos, como nas adoções, por exemplo, o que impede que centenas de crianças ganhem uma família, quando outros são resolvidos com uma "providência padrão"? Será que não temos um pouco de culpa na morte do pequeno Bernardo? Deixe o seu comentário.


G1 (1) e (2)




Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

Cadastre seu e-mail e receba nossas postagens

Blog Widget by LinkWithin