17 setembro 2010

Elis Regina: a estrela que se foi

Mais um fim de semana, mais um pouco de saudade de uma grande estrela da música popular brasileira. Estrela que se foi mas nunca se apagou na memória e no coração dos apaixonados pela boa música, pelas interpretações arrancadas do fundo da alma.

Elis Regina Carvalho Costa, a nossa Elis Regina, a Pimentinha, nasceu em Porto Alegre - RS, em 17 de março de 1945, e morreu em São Paulo, no dia 19 de janeiro de 1982, de forma trágica e prematura, deixando o nome gravado na música popular brasileira. Sua discografia inclui mais de 35 títulos, com grandes destaques, como o LP Elis 1974, por exemplo, considerado por muitos o seu melhor trabalho. Seu bom gosto pela música rendeu a "descoberta" de grandes nomes da MPB como Milton Nascimento, Gilberto Gil, João Bosco e Ivan Lins. O apelido Pimentinha foi dado por Vinícius de Moraes, em homenagem ao seu sorriso largo e à sua jovialidade extrovertida.

Elis Regina começou a carreira de cantora aos onze anos de idade, em um programa de rádio para crianças apresentado na Rádio Farroupilha por Ari Rego, chamado O Clube do Guri. Precoce, lançou o primeiro LP de sua carreira aos 16 anos de idade. Aliás, sobre o começo da estrela, cuja paternidade foi disputada por muitos, disse o produtor Walter Silva à Folha de São Paulo:

- Poucas pessoas sabem quem realmente descobriu Elis. Foi um vendedor da gravadora Continental chamado Wilson Rodrigues Poso, que a ouviu cantando ainda menina, aos quinze anos, em Porto Alegre. Ele sugeriu à Continental que a contratasse, e em 1962 saiu o disco dela. Levei Elis ao meu programa, fui o primeiro a tocar seu disco no rádio. Naquele dia eu disse: menina, você vai ser a maior cantora do Brasil. Está gravado.

Em 1960, Elis foi contratada pela Rádio Gaúcha, e em 1961 viajou ao Rio de Janeiro, onde gravou o primeiro disco, Viva a Brotolândia. Lançou ainda mais três discos, enquanto morava no Rio Grande do Sul.

Em 1964, um ano com a agenda lotada de espetáculos no eixo Rio-São Paulo, assinou um contrato com a TV Rio para participar do programa Noites de Gala. Na mesma época, foi levada por Dom Um Romão para o Beco das Garrafas, que era dirigido pela dupla Luís Carlos Miéle e Ronaldo Bôscoli, com os quais ainda realizaria diversas parcerias, e um casamento: com Bôscoli, em 1967. Acompanhada agora pelo grupo Copa Trio, de Dom Um, cantou no Beco das Garrafas, reduto em que nasceu a bossa nova e onde ela conheceu o coreógrafo americano Lennie Dale, que a ensinou a mexer o corpo para cantar, eliminando os gestos que ela fazia com os braços desde o início da carreira.

Participou do espetáculo O Fino da Bossa, organizado pelo Centro Acadêmico da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo, que ficou conhecido também como Primeiro Demti-Samba, dirigido por Walter Silva, no Teatro Paramount, atual Teatro Abril - São Paulo. Ao final do mesmo ano (1964), conheceu o produtor Solano Ribeiro, idealizador e executor dos festivais de MPB da TV Record. Um ano glorioso, que ainda traria a proposta de apresentar o programa O Fino da Bossa, ao lado de Jair Rodrigues. O programa, gravado a partir dos espetáculos e dirigido por Walter Silva, ficou no ar na TV Record - Canal 7 - São Paulo, até 1967, e deu origem a três discos de grande sucesso: um deles, o Dois na Bossa, foi o primeiro disco brasileiro a vender um milhão de cópias. A partir daí ela se tornou o maior cachê do show business.

O estilo musical interpretado ao longo da carreira, com destaque para a bossa nova, fez com que ela se firmasse como uma das maiores referências vocais do gênero. Aos poucos, o estilo MPB, pautado por um hibridismo ainda mais urbano e popularesco que a bossa nova, distanciando-se das raízes do jazz americano, foi por ela explorado. No samba, consagrou Tiro ao Álvaro e Iracema, de Adoniran Barbosa, entre outros. Notabilizou-se pela uniformidade vocal, primazia técnica e uma afinação a toda prova. O registro vocal pode ser definido como de uma mezzo-soprano característico com um fundo levemente metálico e vagamente rouco.

A partir da década de 1960, quando surgiram os especiais do Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, até o final da década de 1980, a televisão brasileira foi marcada pelo sucesso dos espetáculos transmitidos, que apresentavam os novos talentos e registravam índices recordes de audiência. Foi no Festival que ela conheceu Chico Buarque de Holanda. Elis participou do especial Mulher 80, da Rede Globo, um dos momentos marcantes da televisão. O programa exibiu uma série de entrevistas e musicais cujo tema era amulher e a discussão do papel feminino na sociedade de então, abordando esta temática no contexto da música nacional e da inegável preponderância das vozes femininas, com Maria Bethânia, Fafá de Belém, Zezé Motta, Marina Lima, Simone, Rita Lee, Joanna, Elis Regina, Gal Costa e as participações especiais das atrizes Regina Duarte e Narjara Turetta, que protagonizaram o seriado Malu Mulher.

A antológica interpretação de Arrastão, música de Edu Lobo e Vinícius de Moraes, no Festival, escreveu um novo capítulo na história da música brasileira, inaugurando a MPB e apresentando uma Elis Regina ousada, numa interpretação inesquecível, quando ela acabara de completar apenas 20 anos de idade. O reconhecimento foi imediato e ela recebeu o Prêmio Berimbau de Ouro. Logo depois foi eleita a Melhor Cantora do Ano, recebendo o Troféu Roquette Pinto.

Fã incondicional de Angela Maria, a quem prestou várias homenagens, Elis impulsionava uma carreira não menos gloriosa, possibilitando o lançamento do primeiro LP individual, Samba Eu Canto Assim (CBD, selo Philips). Pioneira, em 1966 lançou o selo Artistas, registrando o primeiro disco independente produzido no Brasil, intitulado Viva o Festival da Música Popular Brasileira, gravado durante o festival. Em mais uma vitoriosa participação no III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, com a canção O cantador, de Dori Caymmi e Nelson Motta, classificou-se para a finalíssima e foi reconhecida com o prêmio de Melhor Intérprete.

Em 1968, uma viagem à Europa a lançou no eixo musical internacional, conquistando grande sucesso, principalmente no Olympia de Paris, a mais antiga sala de espetáculos musicais da Cidade Luz, onde se apresentou duas vezes num mesmo ano, o que jamais havia acontecido com qualquer outra intérprete musical.

Foi Elis quem lançou boa parte de compositores até então desconhecidos, como Milton Nascimento, Renato Teixeira, Tim Maia, Gilberto Gil, João BoscoAldir Blanc Sueli Costa, entre outros. Milton Nascimento, um de seus maiores admiradores, a elegeu musa inspiradora e a ela dedicou inúmeras composições.

Durante os anos 70, aprimorou constantemente a técnica e domínio vocal, registrando em discos de grande qualidade técnica parte do melhor da sua geração de músicos.

Em 1975, com o espetáculo Falso Brilhante, que mais tarde deu origem a um disco homônimo, Elis Regina atingiu enorme sucesso, ficando mais de um ano em cartaz e realizando quase 300 apresentações. Lendário, tornou-se um dos mais bem sucedidos espetáculos da história da música nacional e um marco definitivo em sua carreira. Ainda teve grande êxito com o espetáculo Transversal do Tempo, em 1978, em época de um clima extremamente político e tenso; o Essa Mulher, em 1979, dirigido por Oswaldo Mendes, estreou no Anhembi, em São Paulo, e excursionou pelo Brasil no lançamento do disco homônimo; depois veio o Saudades do Brasil, em 1980, sucesso de crítica e público pela originalidade, tanto nas canções quanto nos números com dançarinos amadores, direção de Ademar Guerra e coreografia de Márika Gidali (Ballet Stagium); e finalmente o último espetáculo, Trem Azul, em 1981, direção de Fernando Faro.

Seus inúmeros sucessos foram: Arrastão, Canção do sal, Redescobrir, Aprendendo a jogar, Casa no campo, Fascinação, Maria Maria, Romaria, Cartomante, Corcovado, Upa, neguinho!, O Bêbado e a Equilibrista, Aquarela do Brasil, Águas de março, Retrato em preto e branco, Alô, Alô Marciano, Dinorah Dinorah, Canção da América, Travessia, Saudosa maloca, Me Deixas Louca, Aviso aos Navegantes, Folhas Secas, O mestre-sala dos mares, Bala com Bala, Tiro ao Álvaro, Iracema, Aquele Abraço, Como Nossos Pais, Doente Morena, Ensaio Geral, Fechado para Balanço, Ladeira da Preguiça, Louvação, No Dia em que Eu Vim Embora, Meio de Campo, O Compositor Me Disse, Gracias a la vida, Oriente, Rebento, Roda, Se Eu Quiser Falar com Deus, Viramundo, dentre muitos outros.

Elis Regina criticou muitas vezes a ditadura brasileira, nos difíceis Anos de Chumbo, quando muitos músicos foram perseguidos e exilados. A crítica tornava-se pública em meio às declarações ou nas canções que interpretava. Em entrevista, no ano de 1969, teria afirmado que o Brasil era governado por gorilas (há ainda controvérsias em relação a essa declaração. Existem arquivos dos próprios militares onde ela se justifica dizendo que isso foi criado por jornalistas sensacionalistas). A popularidade a manteve fora da prisão, mas foi obrigada pelas autoridades a cantar o Hino Nacional durante um espetáculo em um estádio, fato que despertou a ira da esquerda brasileira.

Sempre engajada politicamente, Elis participou de uma série de movimentos de renovação política e cultural brasileira, com voz ativa da campanha pela anistia de exilados brasileiros. O despertar de uma postura artística engajada e com excelente repercussão acompanharia toda a carreira, sendo enfatizada por interpretações consagradas de O Bêbado e a Equilibrista, de João Bosco e Aldir Blanc, canção transformada em hino da anistia e que serviu para coroar a volta de personalidades brasileiras do exílio, a partir de 1979. Um deles, citado na canção, era o irmão do Henfil, o Betinho, importante sociólogo brasileiro.

Outra questão importante, o direito dos músicos brasileiros, foi polêmica que Elis encabeçou, participando de muitas reuniões em Brasília. Além disso, foi presidente da Assim - Associação de Intérpretes e de Músicos.

Em meio a uma enorme comoção nacional e aos 36 anos de idade, Elis Regina, então uma mulher sofrida e martirizada por problemas pessoais, faleceu no dia 19 de janeiro de 1982, segundo foi revelado depois, por complicações decorrentes de uma overdose de cocaína, tranquilizantes e bebida alcoólica. Ela foi sepultada no Cemitério do Morumbi.

Elis Regina é mãe de João Marcelo Bôscoli, filho do casamento com o músico Ronaldo Bôscoli, e de Pedro Camargo Mariano e Maria Rita, filhos do pianista César Camargo Mariano. Como a mãe famosa, os três fazem parte do mundo da música.

Como acima destaquei, muitos foram os sucessos de Elis Regina. Entre eles resolvi destacar dois: Atrás da Porta e O Bêbado e a Equilibrista, momentos marcantes na vida da estrela gaúcha que tanta saudade deixou em milhares de corações brasileiros.








Fonte: Wikipédia

Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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13 comentários:

  1. Olá!
    Muito bem lembrado, Elis é sempre bom, em qualquer ocasião!
    Abçs!
    Rike.

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  2. Com certeza, Rike!

    É sempre bom lembrar o que faz bem ao coração!

    Um abração...

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  3. Oi, Carlos!
    Muito lindo este post. Lembro desta interpretação desta super estrela sempre com muita emoção!!!
    Grande abraço,
    Fátima.

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  4. Acho que a emoção é geral, Fátima!

    Duvido que alguém não se emocione ao rever a Pimentinha, principalmente em momentos como "atrás da porta" e o "bêbado e a equilibrista".

    Obrigado pela força!

    Um abração...

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  5. Oi, Carlos!
    Muito obrigada pela visita ao meu blog e por me adicionar no seu.
    Já votei no Dando Pitacos e o levei para o meu blog! rsrsrs
    Grande abraço e parabéns pelo belo trabalho!

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  6. Valeu, Fátima!

    Eu vi o banner do Dando Pitacos no seu blog. Agradecemos muito pela divulgação.

    Um grande abraço...

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  7. Olá Carlos!
    Eu adorava a Elis. Estava de férias em Paraty quando vi a notícia da morte dela e não queria acreditar...
    Você com certeza ouviu : Essa Mulher, Bolero de Satã e As aparências enganam . Eu gostava muito de cantar estas músicas. A interpretação dela era maravilhosa!
    Parabéns por mais este post.
    Abraço,Vera.

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  8. Minha querida Vera:

    Quando a Elis morreu eu trabalhava no Departamento Jurídico da Companhia Atlantic de Petróleo, no Rio de Janeiro - RJ. A empresa tinha um sistema de áudio central, e foi através dele que ouvi a notícia. Entrei no banheiro pra chorar! Não podia acreditar no que acabara de ouvir. Ela não podia ter morrido! Mas era verdade, infelizmente!

    Quando jovem, ali pelos meus 16 ou 17 anos, eu matava aulas (fazia o ginásio à noite) para assistir às apresentações da Elis com o Jair Rodrigues, no Dois na Bossa.

    Pra mim ela é imortal!

    Um grande abraço...

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  9. Certamente,a pedra fundamental da moderna musica brasileira!!!

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  10. Nasci no nefasto ano de 1982, exatamente no mes 10. O Brasil ainda abafava os soluços roucos da grande perda da Pimentinha. No entanto, isso nao me impediu de ter acesso a sua voz, nem a sua imagem, e ela feriu meu ser com sua voz... Encantava a mim como encantava aos que a assistiam pessoalmente nos muitos palcos de sua carreira! Obrigado Elis!! Voce salvou minha vida. Enquanto ouvia suas gravaços nos discos que comprava nas calçadas das ruas de meu Recife deixava de acompanhar meus colegas de 7 serie do ensino fundamental nas experiencias inicais com maconha... Sua música me prendia, sua voz me contagiava.. os amigos da 7 serie nao contam mais entre os mortais, devido a envolvimento com drogas todos foram assassinadas. A mim, resgatado pela mao pela grande interprete conto com meus 28 anos, psicologo, amante da musica popular brasieira, amante incodicional de ELIS REGINA CARVALHO COSTA! Obrigado Elis!
    Richardson Barroso
    richardsonbarroso@yahoo.com.br

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  11. Seu depoimento é muito interessante, Richardson!

    Como você, também tenho uma história que me ligou à Elis em minha adolescência. Eu cursava o antigo ginásio à noite e "matava" aulas quase todas as terças-feiras (acho que esse era o dia) para assistir o Dois na Bossa, programa que ela apresentava com Jair Rodrigues. Eu era simplesmente apaixonado por ela. Quando ela morreu, eu trabalhava na Companhia Atlantic de Petróleo. Me tranquei no banheiro e chorei muito. Ainda bem que a sua obra não morreu, não é verdade?

    Um grande abraço, e obrigado pela sua participação...

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  12. Bob, eu já conhecia essa interpretação dela da melodia "Atrás da Porta", que vc postou aqui. Quando assisti esse vídeo, eu chorei... Fiquei com tanto dó...Quantos problemas era deveria ter, vc não acha? Tanto é que se não os tivesse, talvez ainda estaríamos nos deleitando a cada nova música gravada por ela! Elis Regina é, simplesmente, insubstituível!
    Com muitos meses de atrasado,receba meu carinho pela excelente postagem ! BEIJOSSSSSSSSS

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  13. Você nunca se atrasa, Neusa! Por uma daquelas coincidências que ninguém explica, encontrei-me hoje com uma amiga que trabalhava comigo na Cia. Atlantic de Petróleo no dia da morte de Elis. Falamos exatamente sobre isso!

    Cheguei em caso hoje com a lembrança da Elis na minha cabeça. Por uma daquelas coincidências que ninguém explica, você só veio partilhar essa lembrança comigo, sem atraso, na hora certa!

    Um grande beijo...

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