01 outubro 2010

OS SUBMUNDOS DO PODER E DA JUSTIÇA

O portal da revista Época publica hoje (01/10) uma reportagem sobre os bastidores de uma história que poderia ter mudado o resultado da votação sobre a validade da Lei da Ficha Limpa levada a cabo (ou não?) pelo Supremo Tribunal Federal - STF. Todo mundo já sabe que o julgamento do recurso apresentado pelo ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), contra a impugnação de sua candidatura pelo Tribunal Superior Eleitoral - TSE terminou empatado em cinco a cinco, e que Roriz desistiu da candidatura ao governo do Distrito Federal e foi substituído pela mulher, Weslian Roriz (PSC). O que muitos não sabem é que o desfecho do julgamento poderia ter sido bem diferente.


Por questão de algumas poucas horas, o relator do caso Roriz no Supremo, o ministro Carlos Ayres Britto, não teve de se declarar impedido de participar do julgamento. Só na tarde da quarta-feira (8) os advogados Adriano José Borges Silva e Adriele Pinheiro Reis Ayres de Britto – genro e filha do ministro – saíram formalmente do recurso apresentado pela defesa de Roriz ao STF. Na mesma noite, Ayres Britto rejeitou o pedido de Roriz.

No dia 1º de setembro, o genro de Ayres Britto enviou aos advogados já contratados por Roriz um e-mail em que transmitia seus dados e os de sua mulher, o que permitiria que os dois fossem subcontratados ambém como advogados de defesa de Roriz. “Favor comunicar ao governador, pois é necessária uma reunião para explicarmos a estratégia e colocá-lo a par acerca dos colaboradores envolvidos”, afirma o advogado Adriano Borges na correspondência eletrônica.

Na reunião entre Joaquim Roriz e Adriano Borges para explicações sobre a “estratégia” a ser utilizada, ocorrida na tarde de 3 de setembro, uma sexta-feira, os dois conversaram no escritório do ex-governador em sua casa no setor de mansões de Brasília. Uma câmera de vídeo oculta filmou a conversa. A revista teve acesso ao vídeo. O diálogo (como mostrado pela revista) é bem interessante e nada republicano:

  • Adriano Borges: “Eu posso então colocar esse pro-labore e o êxito... Eu preciso fazer um ajuste com meu pessoal”.
  • Joaquim Roriz: “Eu gostaria da sinceridade sobre o voto do seu sogro”.
  • Adriano Borges: “A única coisa que eu to precisando é que ele não leve... Com isso, ele não vai participar... Tá impedido”.
  • Joaquim Roriz: “Então é o êxito”.
  • Em seguida, Roriz comemora: “Com isso eu ganho folgado”.

Trocando em miúdos:

Se os advogados Adriano José Borges Silva e Adriele Pinheiro Reis Ayres de Britto, respectivamente genro e filha do ministro Ayres Britto ainda estivessem nos autos no momento do julgamento, ele, Ayres Britto, por imposição da lei processual (artigo 134, do Código de Processo Civil) teria que se declarar impedido, porque não poderia exercer as suas funções em um processo onde um seu parente consangüíneo ou afim figurasse como advogado de uma das partes envolvidas. Com isso, como disse Roriz no diálogo acima estampado, ele ganharia “folgado”, porque sem o voto de Ayres Britto o resultado teria sido cinco a quatro contra a validade da Lei da Ficha Limpa nas eleições do próximo domingo, o que deixaria o caminho para a sua candidatura.

Dentro da lei, tudo aparentemente normal. Um advogado pode patrocinar qualquer causa, de qualquer cliente, fazendo surgir situações como a do julgamento de Roriz. Por essa razão é que a lei, sábia, prevê o impedimento do Magistrado. Mas algumas dúvidas assolam o meu pensamento e me obrigam a alguns questionamentos: será ética a conduta do advogado que se “oferece” para compor a defesa de um processo com o objetivo único de forçar o impedimento do Juiz? Até onde é legal a conduta do advogado que tenta receber (uma fortuna, diga-se de passagem!), casos de Adriano José Borges Silva e Adriele Pinheiro Reis Ayres de Britto, e da parte que se dispõe a pagar, situação específica de Joaquim Roriz, por uma manobra legal mas imoral que poderia ter mudado o resultado do julgamento de um processo? O que ocorre, de verdade, no submundo do poder e da própria justiça?

Se você quiser, clique aqui e confira toda a matéria.

Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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