13 abril 2009

O NOVO ESTATUTO DO ÍNDIO

A notícia está no jornal O ESTADÃO (12/04/1009):


"Uma mudança na legislação bancada pelo governo permitirá que a Justiça puna os índios que cometem crimes com o mesmo rigor com que são julgados os demais brasileiros. O texto do novo estatuto dos povos indígenas, que substituirá a legislação de 1973, será fechado no fim deste mês e define que os índios não são inimputáveis e têm plena capacidade para compreender o significado de seus atos. Para condená-los, a Justiça precisará avaliar se o ato praticado está de acordo com os usos e costumes da comunidade indígena a que pertence e se o índio tinha consciência de que cometia uma ilegalidade.


O novo texto corrige uma incongruência da legislação brasileira. O estatuto dos povos indígenas, que vigora desde 1973, diz que o índio é inimputável, ou seja, que não pode ser punido por seus atos porque não teria condições de saber o que é certo ou errado. A Constituição de 1988, por outro lado, diz que os indígenas podem ir à Justiça defender seus interesses. Poderiam, portanto, ser punidos também por seus atos. A divergência entre as normas criou situações antagônicas no Judiciário. Em alguns casos, os índios ficavam impunes; em outros, mesmo sem a perfeita noção de que haviam cometido um crime, eram julgados com o mesmo rigor que o não-índio.


Para evitar decisões que se choquem, o novo texto exigirá a produção de um laudo antropológico que determinará até que ponto aquele índio sabe que a conduta praticada é criminosa e para investigar se o ato está ou não de acordo com os valores culturais de seu povo. Essas informações serão consideradas pelo juiz na hora de dar o veredicto. Se o ato praticado for ao encontro de seus valores culturais e costumes da comunidade a que pertence, o índio não será punido. Caso contrário, será julgado como qualquer brasileiro. Além disso, a Justiça poderá livrar o índio que já tiver sido punido por sua comunidade".


Acho estranho que só se pense em igualar o índio ao branco quando o assunto é a aplicação da lei penal, mas também acho que quem deve falar pelo índio é o próprio índio!


Na minha opinião, quando se redigiu o Código Civil de 1916 (Lei nº 3.071), imaginava-se que o índio iria submeter-se à cultura branca, integrando-se completamente à sociedade brasileira. O Estatuto do Índio, em vigor desde 1973, seguiu o mesmo caminho. Os legisladores da época esqueceram-se dos costumes e cultura indígenas, e é aí que reside o ponto nevrálgico da questão: como situar o índio diante da lei branca, quando sabemos que ele tem costumes e tradições tão diferentes das nossas?


Entendo que o novo texto vem corrigir um absurdo da própria legislação, pois enquanto o estatuto dos povos indígenas diz que o índio é inimputável, pois não tem discernimento acerca do certo ou errado, a Constituição Federal afirma que ele pode ir à justiça e defender seus interesses, o que vem criando situações antagônicas no Judiciário. Em alguns casos ficam impunes; em outros, mesmo sem a completa noção do ato praticado, são julgados com o mesmo rigor dos brancos.


Por isso a lei, sempre sábia, prevê que a nova regra, para ser aplicada, deverá antes avaliar se o ato praticado está ou não de acordo com os usos e costumes da comunidade a que pertence o suposto infrator e se ele tinha consciência do cometimento de um ato ilegal.


Acho que a questão precisa ser muito bem discutida e avaliada. A sociedade precisa participar mais desse embate. O indígena brasileiro precisa se unir e defender seus interesses. Todo o cuidado é pouco! Não podemos cometer equívocos que possam punir injustamente uma nação que tanto já sofreu e ainda sofre em razão do descaso e negligências das autoridades brasileiras!

Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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5 comentários:

  1. Carlos, esse assunto dá pano para as mangas. Envolve a questão da tutela da FUNAI, se é certa ou errada, e aí vai tempo...
    Sem dúvida é interessante ver que os índios foram lembrados - durante o que a gente chama de Abril Indígena - exatamente para perderem algum privilégio. Mas eu, PARTICULARMENTE, acho uma decisão acertada, se for posta em prática SERIAMENTE.
    É preciso avaliar o grau de aculturamento do índio. Há índios e índios. Acho que já falei aqui que não dá pra comparar índios Guarani de São Paulo que fazem faculdade e tudo com aqueles que tentaram flechar o avião.
    Também há de se levar em conta que muitos ditos "crimes" foram cometidos sob efeito de álcool - o maior "presente" de branco que os índios já receberam. E qual a responsabilidade do Estado nisso? Será que as pessoas ainda acham que índio bebe socialmente? Não bebe não. Quando bebe, bebe de vício mesmo. E cadê os programas de saúde para o tratamento?
    Outro ponto são os crimes que para eles não são crimes por causa da própria cultura.
    É muito complicado. O esteriótipo fala bem alto. Não é só o antropólogo que tem que oferecer um laudo e atestar em que "estágio" o réu se encontra. Há de se criar ainda, para todos os brasileiros, uma verdadeira imagem do índio, com todas as suas diversidades e nuances. E para os já bem aculturados, primeiro vamos dar escolas, depois saúde, e depois cadeia. (Aliás, deveria ser assim para todas as raças desse país, né?)

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  2. concordo com você Anakris, A lei é para todos,e se fizer exatamente o que a lei diz, todos serão beneficiados pela lei, não se pode dizer o que quer ou fazer o que se quer,sem saber o que diz a lei.

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  3. Já debatemos e seguimos na necessidade de avaliar esta questão e outras referentes ao Estatuto do Indio, bem como toda complexidade que envolve o Universo Indígena há séculos.
    Concordo que é no mínimo "estranho" esta mudança que irá realmente promover ao meu ver, margem a mais tensão entre os Parentes Indígenas, que se sentem "caçados" por todos os lados, sem contar "outros" que se beneficiam direta e indiretamente impondo punições injustas e absurdas ao Indígenas, seguirão INVADINDO e manobrando de formas escusas, muitas vezes, para instigar à Sociedade contra os Indígenas, também.

    Voltamos aquela necessidade de se ter uma Comissão permanente nestes assuntos, e nesta comissão, Indígenas que já se formaram sim, em Direito, pois o Juruá (Não Indígena) não tem capacidade de Legislar na totalidade nestes assuntos, por não conhecer e NÃO QUERER conhecer a realidade do que acontece nas Aldeias, nos acampamentos, na Beira das Estradas, e na calada da noite, na Mata, ou mesmo à Luz do dia, quando armadilhas são geradas para incriminar muitas vezes pessoas Inocentes. Não estamos aqui, passando mão ou panos quentes para que Justiça s e faça, tanto para Não Indígena como Indígena."Justiça, sempre deve ser feita", mas não á Ferro e Fogo, não sem apurar todos os detalhes, e com conhecimento de causa.Direito Indígena, poucos conhecem, muito poucos, pois s e quer conhecem a JUSTIÇA DOS HOMENS que nos mostra que não se cumpre deixando impunes os verdadeiros culpados.
    Acredito que se faz mais que URGENTE esta formação d e comissão e que nos assuntos Indígenas, crimes, roubos, qulaquer outro delito envolvendo Nações Indígenas, devam chamar para defesa,Advogados Indígenas, também!!

    A Funai deverá reconhecer esta necessidade, selecionar estes Parentes que irão auxiliar nestas questões, bem como outros Advogados que entendam de Direito Indígena! Uma comissão bem elaborada e remunerada SIM!
    Acho interessante que os "cargos" bem remunerados não contemplam aos Indígenas, nem tampouco lhes concede PODER DE FALA EM SUAS DEFESAS.

    Delega-se apenas ao Não Indígena esta responsabilidade. Então, se realmente se gera esta cobrança dentro do Estatuto, deve-se Contemplar aos Indígenas ocuparem estas cadeiras também, para falarem pelos seus Parentes, sem contar que cada Etnia tem suas particularidades que devem ser igualmente vistas.

    Não se pode resolver esta questão assim., de cima para baixo. Impondo regras distoantes do que reza a Carta Magna. Também deve-se fazer toda esta mudança com BASES de conhecimento e JUSTIÇA de fato.
    Até hoje, sabemos que os Mortos e Feridos tem sido em maior número Indígenas, e muitos Parentes morreram e morrem , mas a Humanidade esquece! APAGA da memória. Para muitos , os Indígenas deveriam estar extintos, para outros, estão, mas para Nós, NÃO estão, nunca estarão extintos ou por se extinguirem.

    As marcas ficam, na Alma daqueles que viram e vêem Inocentes sendo CAÇADOS e Injustamente Condenados.
    Assim foi e é. Infelizmente AINDA É.
    Que Grande Mistério nos ajude à Todos e que Tupã nos dê os caminhos, pois NÃO S E PODE MAIS SUSTENTAR TANTAS INJUSTIÇAS E FALTA DE RESPEITO!
    Liana Utinguassú
    Servidora/Presidente OSCIP Yvy Kuraxo
    FILHA DESTA TERRA

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  4. Amigo Carlos, demais Amigos
    O Pitaco realmente tem um papel importantíssimo! Agrsdecemos em compartilhar.
    Liana Utinguassú

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  5. O blog é que agradece a sua participação, Liana Utinguassú! Você é personagem de destaque na luta pela preservação dos costumes e cultura indígenas. Sua presença aqui mostra que acertamos na criação deste espaço, onde questões variadas podem ser discutidas livre e democraticamente.

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