21 agosto 2014

Desafio do balde de gelo vira autopromoção no Brasil

Foto: reprodução

O desafio do balde de gelo, que surgiu como uma forma de divulgar campanha da ALS Association para levantar doações e dar publicidade à esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma doença rara, acabou por se transformar na última moda da Internet. Atores, cantores, apresentadores de TV, atletas e personalidades de diversas áreas tomaram o banho gelado e publicaram os vídeos em redes sociais, mas a maioria esqueceu o principal, que é falar da doença. E o pior. Além de se desviar do foco, a coisa está virando uma forma de as pessoas se autopromoverem na web.

O esquema da campanha é simples: para atrair as doações, celebridades são desafiadas a aceitar o "desafio do gelo", o "ice bucket challenge". Cada uma delas, depois do banho, pode convidar mais três pessoas a fazer o mesmo, num prazo de até 24 horas. O sucesso da iniciativa está no fato de personalidades com grande número de seguidores nas redes sociais terem entrado na brincadeira. A primeira delas foi Peter Frates, ex-jogador de beisebol, que foi diagnosticado com a doença em 2012. Seu vídeo foi postado em 31 de julho último. Na semana passada, Mark Zuckerberg, do Facebook, participou e desafiou Bill Gates, o criador da Microsoft, a fazer o mesmo. Bill não se esquivou ao compromisso e dois dias depois apareceu em um vídeo tomando o seu banho ajudado por uma engraçada geringonça, no que foi seguido pelo apresentador de TV Jimmy Fallon, pelos cantores Justin Bieber e Justin Timberlake e pelo craque de futebol português Cristiano Ronaldo.

No Brasil, Neymar, Luciano Huck, Angélica e Ivete Sangalo já estão entre as celebridades que entraram na brincadeira. Mas, pelo menos aqui, a coisa parece não funcionar muito bem.

- Viralizar é importante, mas o balde de gelo não explica nada a ninguém. O problema é quando vira a modinha da vez. Muita gente está tomando o banho sem sequer citar a doença e, principalmente, sem fazer doações - avalia Gabriel Simas, diretor da equipe de mídias sociais da agência DM9DDB, que acrescenta:

- Lá fora a campanha foi bem, mas aqui no Brasil está virando festa. As pessoas esquecem de passar a mensagem e o público não entende do que se trata.

Até ontem, a ALS Association já tinha arrecadado US$ 31,5 milhões de mais de 637 mil doadores. O polêmico jogador de pôquer Dan Bilzerian, por exemplo, cumpriu a obrigação cercado por lindas mulheres e uma cabra, mas fez questão de falar sobre a doença e doar US$ 10 mil à instituição. Charlie Sheen, o famoso ator de cinema e TV, trocou a água e o gelo por notas de dólares, deixando o seguinte recado: “o gelo vai derreter e esse dinheiro vai realmente ajudar as pessoas”.

Fátima Bernardes dedicou um programa inteiro à causa e aceitou o desafio em rede nacional. Deborah Secco fez questão de mostrar a foto do comprovante de transferência, o que não foi observado pelas incontáveis celebridades brasileiras que se molharam nos últimos dias, que se limitaram a dar o nome de quem as desafiou e indicar outras três pessoas para participar da brincadeira. Nada mais que isso.

- A campanha corre o risco de virar anedótica - diz Pedro Curi, professor da ESPM Rio.

Ainda assim, a campanha é considerada um verdadeiro sucesso. Silvia Tortorella, diretora executiva do Instituto Paulo Gontijo, uma das três associações brasileiras que trabalham em prol da ELA, concorda que muitos artistas “nem sabem porque estão molhando a cabeça” e acha que a ação está sendo “um pouco banalizada”.

- Não é uma brincadeira. Eu vejo muita gente se mobilizando, mas colocando energia no lugar errado. A campanha é muito séria, sobre uma doença muito séria - afirma Silvia, que no entanto se diz surpresa com o resultado: "o nosso site, que tinha cerca de 500 acessos por dia, agora tem 20 mil."

Silvia não revela o valor das doações, mas admite que elas aumentaram nos últimos dias. Na Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica - ABRELA o aumento das doações é comemorado. Com uma média mensal próxima dos R$ 20 mil, a entidade arrecadou R$ 12 mil apenas nos últimos cinco dias, dinheiro que é aplicado em projetos de atendimento aos pacientes e suas famílias, segundo Élica Fernandes, gerente executiva da instituição, que tem 1,8 mil pacientes cadastrados e uma média de 350 atendimentos por mês.

- E nós destinamos 1% das doações para ajudar na compra de equipamentos para pacientes que não possam arcar com os custos do tratamento - explica Élica.

Além do Instituto Paulo Gontijo e da Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica, a Associação Pró-Cura da ELA também está recebendo doações do desafio do balde de gelo.






Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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