24 setembro 2010

Algemas da lei


O julgamento do recurso interposto por Joaquim Roriz, candidato ao governo do Distrito Federal, que definiria, por tabela, se a Lei da Ficha Limpa vale ou não vale para o pleito de 03 de outubro, foi suspenso na madrugada desta sexta-feira (24/09) depois de um empate na votação: cinco ministros votaram a favor e os outros cinco contra. Aí começaram as especulações para a solução do problema.


A primeira proposta, feita pelo ministro Ricardo Lewandowski, seria considerar válido o resultado do julgamento do TSE, que barrou a candidatura de Joaquim Roriz. Afora isso, duas outras opções seriam viáveis na solução do impasse, de acordo com o regimento interno do próprio Supremo Tribunal Federal - STF: o voto de desempate do presidente, Cesar Peluso, que votou contra a imediata validade da lei, ou a suspensão do julgamento até que seja indicado um novo ministro para o lugar de Eros Grau, que se aposentou em agosto, o que, aliás, já deveria ter sido feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, responsável único pela nomeação dos ministros da mais alta Instância da justiça brasileira, que, coitado, não deve ter tido tempo para cumprir a obrigação, em razão da campanha presidencial de Dilma Rousseff.

A questão provocou mais de uma hora de debate no plenário, depois que os dez ministros já haviam votado. Os que votaram pela não aplicação da ficha limpa lembraram que a solução para o impasse só seria possível se estivesse sendo discutida a constitucionalidade da lei.

- Estamos em sede eminentemente constitucional. O plenário não decidiu que o TSE errou - afirmou Lewandowski.

Por sua vez, o presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso, afastou a possibilidade do voto de desempate:

- Eu não tenho nenhuma vocação para déspota. Nem acho que meu voto vale mais do que o de qualquer dos outros ministros. Se valesse, cinco não teriam discordado - disse Peluso.

Em busca de uma solução para o impasse, Peluso chegou a apelar para a “responsabilidade histórica do tribunal”:

- Temos que deixar um pouco de lado esse tipo de paixão de sustentar posições. Nenhum dos ministros cede em seus pontos de vista. Estamos em uma situação de radicalidade absoluta. A sociedade perceberá logo que é uma decisão artificial - disse o ministro.

Apesar de terem concordado com a suspensão do julgamento por tempo indeterminado, alguns ministros falaram sobre os prejuízos de não terem chegado a um consenso, mesmo após 11:00 horas de debate.

- Estamos em pleno processo eleitoral. As eleições se avizinham e a cada dia que passa os candidatos impugnados estão sofrendo prejuízos irreparáveis - disse Lewandowski, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral - TSE.

- O jurisdicionado ficará sangrando ou será uma candidatura sub judice. Grande parte do eleitorado não vota em certo candidato que tenha a situação sub judice. Vamos paralisar a jurisdição - afirmou Marco Aurélio, que fez ainda uma referência irônica:

- Confesso que receei convocarmos para desempatar o responsável por ter até essa altura uma cadeira vaga - declarou, referindo-se ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem cabe nomear os ministros do STF.

Votaram contra a validade da lei nas eleições deste ano e a liberação do registro de candidatura de Joaquim Roriz os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Cezar Peluso. A favor da lei e contra a candidatura do ex-governador, Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski e Ellen Gracie Northfleet.

Queimando no centro dessa fogueira de vaidades, desse absurdo e inconcebível tiroteio de teses jurídicas, sujeita a ser atingida pela bala perdida da incompetência e ineficiência da mais alta Corte de justiça do país, está a sociedade, está o cidadão brasileiro, tanto o que vota como o que espera ser votado.

É o próprio presidente do Supremo Tribunal Federal – STF, ministro Cesar Peluso, quem admite que ele e os colegas deveriam esquecer a paixão e a radicalidade no sustento de algumas posições jurídicas, até porque a sociedade logo perceberá que tudo não passou de “uma decisão artificial”. Por que, então, ele próprio não deixou de lado o receio de ser tachado como “déspota” e decidiu a questão, como lhe permite o regimento interno da Corte? O que ele acha, por exemplo, que ficará melhor em seu curriculum vitae? O despotismo ou a omissão?

Aliás, quando deram início ao julgamento do recurso de Roriz, essa é a verdade, os ministros que estavam no Plenário do STF já sabiam qual seria o resultado final, porque todos, além das próprias opiniões, conheciam e conhecem as posições dos colegas de julgamento. Por que deixaram que a farsa acontecesse? Por que Cesar Peluso não se trancou com todos e lhes disse:

- Olha aqui minha gente! Todo mundo já sabe que somos ricos em teses jurídicas e vaidades, mas não podemos entrar naquele Plenário e mentir para a Nação. Temos a obrigação de dar uma resposta à sociedade brasileira: a tal Lei da Ficha Limpa vale ou não vale? É sim ou não!

Votar ou não votar em candidato que responde a processo judicial, eis a questão!

Todos, eleitores e candidatos esperavam que a lei lhes apontasse o caminho certo, a atitude correta. E o que acontece? A lei tropeça num festival de teorias jurídicas e não entrega ao país a prestação jurisdicional que lhe compete, mesmo sabendo dos danos que isso causa à Nação, como reconheceu o ministro Ricardo Lewandowski.

Uma pergunta corre hoje corre os quatro cantos do país: Será correto votar em candidato que responde a um processo judicial? Sim ou não? Por favor, senhores deuses da lei! O Brasil tem 130 milhões de eleitores esperando por essa resposta, e se ela não chegar a tempo, não os culpem pelo voto equivocado, não os responsabilizem pela eleição de um possível criminoso, pois culpa não lhes caberá! A culpa, toda a responsabilidade, não tenho dúvidas, será da lei e dos “profissionais” do Direito que não souberam ou não quiseram aplicá-la!

Aliás, vigora no Direito Penal a máxima do in dubio pro reo (na dúvida, pelo réu). Com certeza, baseado na dúvida chancelada pelo Supremo Tribunal Federal - STF, o eleitorado brasileiro vai eleger centenas de potenciais criminosos, que a partir da diplomação estarão protegidos pelo manto da imunidade parlamentar, diante uma sociedade que não pode reagir, eis que imobilizada pelas algemas da lei. Pobre Brasil!

Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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4 comentários:

  1. Olá meu querido amigo!
    Só passei aqui para te deixar um grande beijo e para desejar-lhe um ótimo final de semana. Como você deve ter percebido, não comento publicações ligadas à política, mas, leio os textos. Só prefiro não comentar mesmo, tá?
    De qualquer forma é sempre um enorme prazer vir te visitar.
    Grande beijo,
    Jackie

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  2. Foi um dos maiores atos de covardia que já vi. Que decidissem contra ou a favor, mas que decidissem. Deixar para o final do ano foi uma irresponsábilidade histórica do presidente Cezar Peluso, que tem regimentalmente o poder e o dever, diga-se de passagem, de arbitrar quando há empate. Sendo o empate em si uma grande imoralidade "suprema".

    A biografia dos integrantes deste tribunal foi seriamente arranhada com este episódio.

    Um forte abraço!

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  3. Você disse tudo, Sérgio!

    A biografia dos atuais integrantes do STF "foi seriamente arranhada com este episódio", que também pra mim "foi um dos maiores atos de covardia" já assistidos.

    Parabéns pela clareza e objetividade so seu comentário!

    Um abração...

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