28 julho 2010

A escolha de Sofia




Rodrigo Constantino é um dos nomes mais famosos na blogosfera política verde e amarela.

O blog por ele criado, que tem o seu nome, é uma das leituras recomendadas pelo Dando Pitacos. Seus artigos são publicados em dezenas de páginas na internet, inclusive por blogueiros, o que a meu ver nada tem de errado quando a autoria é preservada. Aliás, copiar e divulgar o que é bom e pode ser útil à sociedade, principalmente em matéria política, é atitude que não merece reparos.

Mas o texto que você vai ver logo abaixo não foi copiado por mim, mas enviado por uma grande amiga, a Nereyde (cujo sobrenome não vou divulgar por razões estritamente pessoais).


Ela declara seu voto e confessa que o conteúdo da postagem feita pelo Rodrigo Constantino caiu para ela "quase" como uma luva, e por isso ela resolveu repassar a mensagem para os amigos, até por um dever cívico e por achar que o seu conteúdo pode ajudar a alguém que como ela, "já pensou ou pensa em anular o voto".

Além disso, está escrito no email que ela me enviou:

"O maior castigo para aqueles que não se interessam por política, é que
serão governados pelos que se interessam."
Arnold Toynbee

Como vocês sabem, a escolha de Sofia é a história de uma mãe judia no campo de concentração nazista de Auschwitz, que é forçada por um soldado alemão a escolher entre o filho e a filha - qual será executado e qual será poupado. Se ela se recusasse a escolher, os dois seriam mortos. Ela escolhe o menino, que é mais forte e tem mais chances de sobreviver, porém nunca mais tem notícias dele.

A questão é tão terrível que o título se converteu em sinônimo de decisão quase impossível de ser tomada.

Envio para vocês um artigo escrito em final de 2009 pelo economista Rodrigo Constantino. Autor de 5 livros. Escreve a coluna "Eu e Investimentos" do jornal Valor Econômico. É também colunista do jornal O Globo. Membro-fundador do Instituto Millenium. Vencedor do prêmio Libertas em 2009, no XII Forum da Liberdade. Seu curriculum vai muito além, é extenso e respeitável".


Aí, ela solta o texto do Rodrigo Constantino, que tem o mesmo título dessa postagem e é ilustrado pela mesma foto da matéria original.



"Aécio Neves pulou fora da corrida presidencial de 2010. Agora é praticamente oficial: José Serra e Dilma Rousseff são as duas opções viáveis nas próximas eleições. Em quem votar? Esse é um artigo que eu não gostaria de ter que escrever, mas me sinto na obrigação de fazê-lo. Afinal, o futuro da liberdade está em jogo, sob grande ameaça. Nenhuma das opções é atraente. Nenhum dos candidatos representa uma escolha decente para aqueles que defendem as liberdades individuais. Será que há necessidade de optar? Ou será que o voto nulo representa a única alternativa?

Tais questões me levaram à lembrança do excelente livro O Sonho de Cipião, de Iain Pears, uma leitura densa que desperta boas reflexões sobre o neoplatonismo. Quando a civilização está em xeque, até onde as pessoas de bem podem ir, na tentativa de salvá-la da barbárie completa? Nas palavras do autor: “Usamos os bárbaros para controlar a barbárie? Podemos explorá-los de modo que preservem os valores civilizados ao invés de destruí-los? Os antigos atenienses tinham razão ao dizerem que assumir qualquer lado é melhor do que não assumir nenhum?”

Permanecer na “torre de marfim”, preservando uma visão ideal de mundo, sem sujar as mãos com um voto infame, sem dúvida traz conforto. Manter a paz da consciência tem seus grandes benefícios individuais. Além disso, o voto nulo tem seu papel pragmático também: ele representa a única arma de protesto político contra todos que estão aí, contra o sistema podre atual. Somente no dia em que houver mais votos nulos do que votos em candidatos o recado das urnas será ouvido como um brado retumbante, alertando que é chegada a hora de mudanças estruturais. Os eleitos sempre abusam do respaldo das urnas, dos milhões de eleitores que deram seu aval ao programa de governo do vencedor, ainda que muitas vezes tal voto seja fruto do desespero, da escolha no “menos pior”.

Mas existem momentos tão delicados e extremos, onde o que resta das liberdades individuais está pendurado por um fio, que talvez essa postura idealista e de longo prazo não seja razoável. Será que não valeria a pena ter fechado o nariz e eliminado o Partido dos Trabalhadores Nacional-Socialista em 1933 na Alemanha, antes que Hitler pudesse chegar ao poder? Será que o fim de eliminar Hugo Chávez justificaria o meio deplorável de eleger um candidato horrível, mas menos louco e autoritário? São questões filosóficas complexas. Confesso ficar angustiado quando penso nisso.

Voltando à realidade brasileira, temos um verdadeiro monopólio da esquerda na política nacional. PT e PSDB cada vez mais se parecem. Ambos desejam mais governo. Ambos rejeitam o livre mercado, o direito de propriedade privada, o capitalismo liberal. Mas existem algumas diferenças importantes também. O PT tem mais ranço ideológico, mais sede pelo poder absoluto, mais disposição para adotar quaisquer meios – os mais abjetos – para tal meta. O PSDB parece ter mais limites éticos quanto a isso. O PT associou-se aos mais nefastos ditadores, defende abertamente grupos terroristas, carrega em seu âmago o DNA socialista. O PSDB não chega a tanto.

Além disso, há um fator relevante de curto prazo: o governo Lula aparelhou a máquina estatal toda, desde os três poderes, passando pelo Itamaraty, STF, Polícia Federal, as ONGs, as estatais, as agências reguladoras, tudo! O projeto de poder do PT é aquele seguido por Chávez na Venezuela, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador, enfim, todos os comparsas do Foro de São Paulo. Se o avanço rumo ao socialismo não foi maior no Brasil, isso se deve aos freios institucionais, mais sólidos aqui, e não ao desejo do próprio governo. A simbiose entre Estado e governo na gestão Lula foi enorme. O estrago será duradouro. Mas quanto antes for abortado, melhor será: haverá menos sofrimento no processo de ajuste.

Justamente por isso acredito que os liberais devem olhar para este aspecto fundamental, e ignorar um pouco as semelhanças entre Serra e Dilma. Sim, Serra tem forte viés autoritário, apresenta indícios fascistas em sua gestão no governo de São Paulo, deseja controlar a economia como um czar faria, estou de acordo com isso tudo. Serra representa um perigo para as liberdades, isso é fato. Mas uma continuação da gestão petista através de Dilma é um tiro certo rumo ao pior. Dilma é tão autoritária ou mais que Serra, com o agravante de ter sido uma terrorista na juventude comunista, lutando não contra a ditadura, mas sim por outra ainda pior, aquela existente em Cuba ainda hoje. Ela nunca se arrependeu de seu passado vergonhoso; pelo contrário, sente orgulho. Seu grupo Colina planejou diversos assaltos. Como anular o voto sabendo que esta senhora poderá ser nossa próxima presidente?! Como virar a cara sabendo que isso pode significar passos mais acelerados em direção ao socialismo “bolivariano”?

Entendo que para os defensores da liberdade individual, escolher entre Dilma e Serra é como uma escolha de Sofia: a derrota está anunciada antes mesmo da decisão. Mesmo o resultado “desejado” será uma vitória de Pirro. Algo como escolher entre um soco na cara ou no estômago. Mas situações extremas demandam medidas extremas, e infelizmente colocam certos valores puristas em xeque. Anular o voto, desta vez, pode significar o triunfo definitivo do mal. Em vez de soco na cara ou no estômago, podemos acabar com um tiro na nuca.

Dito isso, assumo que votarei em Serra, mas não sem antes tomar um Engov. Meu voto é anti-PT acima de qualquer coisa. Meu voto é contra o Lula, contra o Chávez, que já declarou abertamente apoio a Dilma. Meu voto não é a favor de Serra. E, no dia seguinte da eleição, já serei um crítico tão duro ao governo Serra como sou hoje ao governo Lula. Mas, antes é preciso retirar a corja que está no poder. Antes é preciso desarmar a quadrilha que tomou conta de Brasília. Ainda que depois ela seja substituída por outra parecida em muitos aspectos. Só o desaparelhamento de petistas do Estado já seria um ganho para a liberdade, ainda que momentâneo.

Respeito meus colegas liberais que discordam de mim e pretendem anular o voto. Mas espero ter sido convincente de que o momento pede um pacto temporário com a barbárie, como única chance de salvar o que resta da civilização – o que não é muito".

Reavaliando algumas idéias que já me passaram pela cabeça, também acho, como a minha querida Nereyde, que não devemos anular o voto. Temos, sim, que participar do processo e tentar fazer valer nossas convicções pelo resultado das urnas, por ação, jamais por omissão. Mudar ou dar continuidade ao que aí está vai depender da consciência de cada um. Mais do que nunca, votar é preciso!



Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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8 comentários:

  1. Meu querido Roberto!
    Belíssimo artigo!
    Não sou fã de política. Não porque seja alienada ou que não me interesse pelo futuro da nação. Simplesmente porque entra ano e sai ano, mudam os personagens, mas as histórias são sempre as mesmas. Época de eleição também!
    Anular o meu voto, não faço. Não compartilho a informação do meu voto ou da minha preferência porque simplesmente não se pode falar de algo que causa tantas controvérsias. Gosto, sim, de ler o que escrevem , analisar os perfis, ver as provas sobre condutas, passado, carreira política, etc.
    Você me conhece um pouco, até porque escrevo muito sobre mim e o que guia a minha vida: meus sentimentos, portanto sabe que não sou pessoa de se esconder ou fugir de nada. Nesse caso apenas, fico na minha porque dificilmente se encontra pessoas que sejam capazes de entender (nem digo aceitar) o ponto de vista do outro. E como acho que é uma discussão inútil, afinal alguém será eleito e ponto! Seja o meu, o seu ou o deles...mas um candidato será eleito!
    O que temos que pensar é (no meu humilde e simples pensamento doméstico) por quê não podemos escolher os pré-candidatos? Por que temos que aceitar os escolhidos pelo partido? Sei lá...visão de uma dona de casa leiga e talvez, aí, alienada mesmo.
    Grande beijo e perdoe pelo papo prolongado.
    Jackie

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  2. Minha querida Jackie:

    Você tem toda a razão desse mundo quando diz que "entra ano e sai ano, mudam os personagens, mas as histórias são sempre as mesmas". É verdade!

    E isso acontece porque ter o poder é muito bom: traz status, autoridade, muita publicidade, mas sobretudo, dinheiro, muito dinheiro. Os salários de um parlamentar no Brasil, acrescidos, claro, de inúmeras vantagens, é um grande começo. Mas o mais importante é o que se consegue a partir das grandes negociatas, das trocas de favores, do favorecimento, das emendas parlamentares, enfim, de todas aquelas coisas nojentas que já conhecemos e não conseguimos mudar, ao menos até aqui.

    Você é uma mulher inteligente (digo isso desde que a conheci), e está certa em não revelar sua preferência política, evitando discussões tolas, insinuações maldosas e verdadeiras agressões por parte dos que não sabem entender (seria realmente demais querer que aceitassem) "o ponto de vista do outro".

    Eu também sempre achei que um candidato, independentemente do cargo político, não deveria ser imposto, mas escolhido. Seria muito mais democrático e menos constrangedor.

    Infelizmente o nosso sistema é esse, e com ele temos que conviver, não sem luta, acredite, para que as mudanças aconteçam um dia!

    Um beijão...

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  3. Putz, o cara aí me botou na frente de um assunto no qual tenho evitado a todo custo pensar, exatamente porque também o vejo como uma escolha de Sofia. Aliás desde que comecei a votar que sempre foi na escolha no menos ruim, mas confesso que estou cansada disso. É frustrante e desgastante. Se houvesse a possibilidade de, pelo menos, 60% dos eleitores votarem nulo, seria a solução como diz o artigo. Este ano sairei pela tangente e ficarei no "justificar a ausência". Meu estômago fica tranquilo, mas não minha consciência porque uma das duas "porcarias" vai se eleger.
    Cruz credo, que país é esse?
    parabéns pela postagem.
    abração
    Atena

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  4. Morri de rir com o seu comentário, Atena!

    Realmente, a cada pleito somos submetidos a uma escolha desagradável: escolher o menos pior! Mas ainda acredito que isso pode mudar, e o voto, com certeza, é a única arma de que nos podemos valer.

    Mas sua pergunta tem tudo a ver: "Cruz credo, que país é esse?"

    Um grande abraço...

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  5. Caro amigo, fiquei feliz pelo repasse do texto, no dando pitaco.
    Eu gostariade ver cidadaõs com a mente bastante responsavel na hora do voto.
    Melhor não dar o voto a quem não merece é procurar a quem merece.Se anular o voto não vai anular a eleição. O que devemos fazer e ter cuidado, para que teu voto não seja a expressão de nossas ambições individuais, esse é um pensamento (meu)
    Abraço muito querido

    ResponderExcluir
  6. É exatamente isso que o país precisa: voto consciente e responsável. Seu pensamento está correto!

    Um grande abraço e obrigado pela sua participação...

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  7. Caro amigo, fiquei feliz pelo repasse do texto, no dando pitaco.
    Eu gostariade ver cidadaõs com a mente bastante responsavel na hora do voto.
    Melhor não dar o voto a quem não merece é procurar a quem merece.Se anular o voto não vai anular a eleição. O que devemos fazer e ter cuidado, para que teu voto não seja a expressão de nossas ambições individuais, esse é um pensamento (meu)
    Abraço muito querido

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  8. Minha amiga Nereyde:

    Eu também fico feliz de te encontrar aqui, acredite!

    Sua participação me dá a idéia de que o trabalho até aqui desenvolvido no Dando Pitacos é de boa qualidade, senão você cá não estaria.

    Em relação à matéria, estamos, realmente, diante de uma escolha tal qual a de Sofia, mas como você disse, temos que tentar dar o nosso voto a quem merece, vigiar para que ele não se transforme em utensílio de nossas ambições ou crenças pessoais, até porque o candidato que ele vai eleger não governará só para quem nele votou, mas para toda a sociedade.

    Esteja sempre por aqui!

    Um grande beijo...

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