Melodia da corrupção

Segundo reportagem hoje publicada no O Globo, o usuário do telefone Nextel 7812-7026 - ID 55*8375*19, que pertence à Rádio Melodia, utilizaria o aparelho para falar com o empresário Ricardo Andrade Magro, dono do grupo que adquiriu a Refinaria de Manquinhos, base operacional de uma fraude que pode chegar a R$ 850 milhões.

A emissora, que pertence ao ex-deputado federal Francisco Silva, tem sede na Barra da Tijuca - RJ. Com alcance nacional, a rádio tem em sua programação músicas do estilo gospel, distribuição de prêmios e programas apresentados por políticos evangélicos e pastores, e por conta disso já chegou a ocupar o primeiro lugar nas pesquisas de audiência.

Francisco Silva foi deputado por três mandatos (1991 a 2003), chegando a ser o deputado federal mais votado do Estado do Rio. Seu filho, Fábio Silva (PSDC) é deputado estadual, reeleito em outubro.

Foi a Rádio Melodia que gerou, até 2006, o programa “A Paz do Senhor, Governador", onde Anthony Garotinho, que chefiava o Executivo fluminense à época, fazia prestações de contas de seu governo. É também usada por políticos evangélicos, que transformam o espaço em púlpito religioso.

O Supremo Tribunal Federal - STF é a chave de uma investigação que já produziu 40 volumes de dados sobre fraudes na venda de combustíveis no Estado do Rio. A Polícia Civil concluiu que a linha telefônica foi usada por "um deputado federal ou senador da República", que comandava de Brasília, nos contatos com Magro (acusado de ser um dos responsáveis pelo esquema de evasão fiscal), as operações ilegais da suposta quadrilha.

A máfia contava com aliados em outros setores públicos para blindar o esquema de fraude. O inquérito também levanta suspeitas sobre o envolvimento de um ministro de estado, de seu filho e de funcionários da Agência Nacional do Petróleo - ANP, acusados na investigação de fornecer informações privilegiadas para prevenir a quadrilha de eventuais fiscalizações na Refinaria de Manguinhos, a base de operações do grupo.

A Refinaria de Manguinhos foi adquirida pelo grupo Andrade Magro em 2008, mas se manteve como “refinaria” apenas no nome, já que, na prática, passou a funcionar como um centro distribuidor de combustível. Para aplicar o golpe, de acordo com as investigações, a empresa utilizava um regime especial de substituição tributária, concedido nos governos de Benedita da Silva (2002), e Rosinha Garotinho (2005), que permitia que as distribuidoras comprassem o produto sem recolher o ICMS devido diretamente na origem (refinarias).

Mas o regime só poderia ser aplicado em operações interestaduais, sistema que a Refinaria de Manguinhos burlou, valendo-se de um artifício para também não pagar o imposto no destino (varejo): o "passeio de notas", ou seja, mandava apenas as notas fiscais para distribuidoras em outros estados e acabava por despejar no Rio os combustíveis não tributados.

Números levantados pela CPI que investigou o assunto na Assembléia Legislativa indicam evasão de R$ 850 milhões só entre a concessão do regime especial e 2006, quando ele foi suspenso. As distribuidoras e Manguinhos negaram, na época, a evasão.

O decreto de 2005 foi fruto de uma guerra jurídica. Logo que assumiu o governo, Sérgio Cabral suspendeu o decreto, que depois voltou a valer por força de liminar concedida pelo Tribunal de Justiça do Rio. A liminar foi cassada no Supremo Tribunal Federal - STF, e o decreto, finalmente, suspenso.

Quem serão os mafiosos da vez? Será que chegaremos a saber? Irão pra cadeia? Quem pode responder a essas perguntas?

Sobre o Autor:

Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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