Você sabia que um aluno do ensino superior custa ao governo federal, por ano, cerca de um terço a menos que um criminoso? E nos Estados? Você por acaso já ouviu dizer que um presidiário consome anualmente nove vezes mais que um aluno do ensino médio?
É isso aí! O país investe anualmente mais de R$ 40 mil por ano em cada interno nos presídios federais, e, no mesmo período, cerca de R$ 15 mil com cada aluno do ensino superior. Já a níveis estaduais, justamente onde está a maior parte da população carcerária do país, a comparação entre a despesa com detentos e alunos do ensino médio (nível de ensino cuja obrigação está a cargo dos governos estaduais), o disparate é ainda maior: gasta-se, em média, R$ 21 mil por ano com cada preso e R$ 2,3 mil por aluno.
Pesquisadores das áreas de segurança pública e educação concluíram que o contraste de investimentos mostra, de forma bem clara, dois graves problemas na condução desses setores no país: o baixo valor investido na educação e a ineficiência do gasto com o sistema prisional. Levando em conta apenas as matrículas atuais, o chamado investimento público direto por aluno no país deveria ser hoje, no mínimo, de 40% a 50% maior. Esta foi a conclusão a que chegou a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que desenvolveu um cálculo, chamado custo aluno-qualidade, considerando gastos (de salário do magistério a equipamentos) para uma oferta de ensino de qualidade.
— Para garantir a realização de todas as metas do Plano Nacional de Educação que está tramitando no Congresso, seriam necessários R$ 327 bilhões por ano, o que dobra o investimento em educação — afirma Daniel Cara, coordenador da campanha.
Para o pesquisador, não há que se falar em sobreinvestimento no preso, "até porque vemos como é precária a situação das penitenciárias brasileiras", e também porque, lembra ele, a prisão é uma "instituição total, o preso vive lá":
— Mas há, sem dúvida, subinvestimento em educação. O que é mais grave se considerarmos que, nos direitos sociais, a educação é o que abre as portas para os outros direitos. A violência não vem pela pobreza, vem pela desigualdade. Por isso, um investimento maior no conjunto dos direitos sociais, e aí se inclui a educação, poderia diminuir a despesa com segurança.
Segundo Mozart Neves Ramos, do Todos pela Educação e do Conselho Nacional de Educação - CNE, o gasto com educação poderia melhorar com maior foco na aprendizagem:
— É verdade que o Brasil ainda investe pouco na educação básica, e mais dinheiro é fundamental. No entanto, é necessário que a verba chegue à escola e que seja mais bem aplicada. Melhorar a eficiência da gestão dos recursos é importantíssimo. Uma boa gestão pode criar uma escola motivadora. E um aluno que tem sucesso escolar raramente abandona a escola e está mais longe de ser preso.
Débora Magalhães, por exemplo, filha de Vitânia, mulher presa em Bangu por tráfico de drogas, desabafa:
— Minha mãe, que está presa há três meses, estudou só até a 2 série. Eu acredito que ela está presa também por conta do pouco conhecimento que tem. Nunca soube que carreira seguir, nunca teve um ensino que a fizesse ter alguma perspectiva.
Wilson Risolia, atual secretário estadual de Educação do Rio, afirma que o Brasil prefere "gastar mais com o sinistro do que com o seguro":
— É uma irracionalidade, um passivo que o Estado precisa resolver. Nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE, o custo por aluno no nível superior é cerca de três vezes maior do que na educação básica. No Brasil, é bem maior (mais de seis vezes). Mas não é suficiente aumentar o gasto, é preciso melhorar a qualidade. No Rio, fizemos uma recontagem de alunos e vimos que havia 120 mil que, apesar de constarem na base de dados, não eram mais da rede. A verba era passada para alunos que não existiam; um número X de provas ia para o colégio, e parte era jogada no lixo, por exemplo. Corrigindo, foram R$ 111 milhões alocados em outros lugares.
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, o sociólogo Michel Misse diz que apesar ser menor, a diferença entre o custo do aluno universitário e o do preso em presídios federais é o que choca mais:
— Esse é um dado impressionante, porque o custo de um universitário, pelos gastos que uma universidade deve ter com pesquisa, deveria ser bem maior. É o custo de você formar um cientista, um médico, um engenheiro — afirma Misse.
Mas ele alerta que não se deve pensar que o custo de uma prisão seja pequeno:
— O preso mora lá, e um aluno não mora na escola. O problema é analisar o gasto que se tem em relação às condições dos presídios.
Carlos Lélio Lauria Ferreira, presidente do Conselho Nacional de Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Administração Penitenciária - Consej, diz que quanto mais baixo o custo com o preso, piores as condições:
— O preço varia de acordo com o tratamento. Se o valor é baixo, desconfie. A alimentação pode ser lavagem. No Brasil, a média de custo de um preso num presídio estadual é de R$ 1,7 mil por mês. Mas nessa conta não está incluído o custo social e previdenciário. No presídio federal, o custo é mais elevado. O aparato tecnológico é caro, os salários dos servidores são mais altos e o número de agentes por preso é maior. Graças a isso, o país não gasta menos de 7 mil por preso ao mês.
Sou leigo no assunto, mas acho que mais incentivo e oportunidades, além de uma escola de melhor qualidade, poderiam ajudar no esvaziamento do sistema prisional. Assim como há quem traga o crime no DNA, e não mude seu destino por causa da escola, existem os que sonham com uma vida melhor através do estudo, o que lhes é vedado por um sistema cruel, que avesso à prevenção, acaba tendo que investir na construção de penitenciárias que vão abrigar quem poderia ter um destino melhor e mais cidadão, até porque a violência não é fruto da pobreza, mas da desigualdade.
Fonte: O Globo
Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral. |