03 fevereiro 2010

Como Viver a Vida, segundo a Globo

Recebi um email hoje com esse texto do Leandro Vieira. No email não vinha a autoria do artigo, mas depois de uma olhadinha no Google, descobri que o Leandro tem um blog - o Blog do Leandro - dentro do site da Abril.com - publicação Você S/A - sessão Administre-se.


Como Viver a Vida, segundo a Globo

20 jan 2010



É fato: as novelas da Globo e seus programas de grande audiência continuam ditando normas, valores e costumes. Volta e meia ouvimos alguém soltar famosos bordões como “hare baba”, “tô certo ou tô errado?”, “né brinquedo não”, “ishalá”, e outros consagrados pelos folhetins globais.

Antes que alguém levante a mão para perguntar, esse texto tem, sim, muito a ver com Administração. Qualquer evento que influencie, direta ou indiretamente, o nosso comportamento é extremamente importante para a forma como conduzimos os nossos negócios. Não é à toa que os grandes anunciantes disputam a peso de ouro o horário nobre da televisão brasileira – bem como os próprios atores. Da mesma forma, as grifes (re)direcionam suas coleções aos estilos exibidos pelas belas e influentes atrizes das novelas, mesmo que essas se passem em lugares exóticos como Índia e Marrocos, ou genuinamente brasileiros como Barretos, Rio e São Paulo. Até pouco tempo atrás, muitas moças estavam usando parte do sutiã à mostra, para imitar o modelito de Norminha, a simpática – e faceira – personagem interpretada recentemente por Dira Paes. Novelas ditam modas e, como administradores, devemos estar atentos.

Espanta-me essa última, que traz o curioso título de “Viver a Vida”. Apesar de apresentar depoimentos emocionantes de pessoas reais que superaram grandes problemas no final dos episódios, Viver a Vida dá um show de deturpação de valores do começo ao fim de cada capítulo.

Normalmente, as obras de ficção dividem claramente as pessoas entre boas e más, o certo e o errado são evidentes, e nos colocamos a torcer pelo sucesso do protagonista e o castigo dos vilões, como o fizemos em A Favorita, com o duelo entre Donatela e Flora.

Na novela de Manoel Carlos, esse dualismo não existe. Com a desculpa de aproximar seus personagens da realidade, o autor lhes confere virtudes e defeitos. Entretanto, paira um ar de normalidade sobre todas as safadezas cometidas pelos personagens, que eu chego a me perguntar o que ele quer dizer, realmente, com “viver a vida”.

Viver a Vida é uma novela onde praticamente todos os personagens enganam uns aos outros. O marido trai a esposa com a prima dela, a esposa trai o marido com o cara da academia, o outro troca a companheira de uma vida inteira por uma modelo 30 anos mais jovem , que agora já vive um affair com o sujeito que conheceu no meio do deserto (que corre o risco de ser filho de seu próprio marido), irmãos (gêmeos!) disputam a mesma garota… ufa! E tem muito mais, mas não quero tirar a paciência do leitor com essas picuinhas.


Onde mora o perigo?


Diversos estudos, em especial os conduzidos pelo Prof. Robert B. Cialdini, da Arizona State University, demonstram que temos uma grande tendência a fazer o que a maioria faz – mesmo que seja um comportamento socialmente indesejável. Segundo Cialdini, somos naturalmente maria-vai-com-as-outras*.

Manoel Carlos gasta o seu latim para provar que trair é algo normal, que todo mundo trai todo mundo e não há nada reprovável nisso. Pelo contrário: é até algo bonito, poético. As puladas de cerca ocorrem sempre com o belíssimo pano de fundo da cidade maravilhosa ao entardecer, do alto de uma asa delta, ou nas areias paradisíacas de Búzios, ao som de uma belíssima trilha sonora. Sei lá, sei lá…

Há algum tempo, havia em minha cidade um jornalzinho que circulava entre os colégios, cuja maior atração eram os recadinhos que os alunos postavam uns para os outros. Depois que Aline Moraes interpretou uma jovem lésbica em uma novela, houve uma explosão de recados (românticos) de garotas para garotas. Não estou fazendo juízo de valor no que diz respeito às escolhas sexuais de ninguém. Entretanto, desconfio que muitos desses recados não tinham nada a ver com a sexualidade dessas garotas. Elas apenas queriam ser a Aline Moraes… Imagino que, se a personagem da bela atriz fosse interpretada por Regina Casé, o efeito no jornal teria sido nulo ou completamente inverso.

Mesmo sabendo que o comportamento é uma potente fonte de influência social, geralmente as pessoas que participam de estudos de psicologia social dizem com veemência que o comportamento alheio não influencia o seu próprio. Você aí do outro lado também deve estar dizendo que isso é uma grande besteira, que você não é influenciado por novelas, nem por ninguém. Beleza. Mas, com certeza, você conhece um monte de gente que adora seguir a maioria.

O perigo está na mensagem, repetida diariamente à exaustão, justamente no horário em que a maioria dos televisores sintoniza a rede do plim-plim. Muita gente assimila o comportamento dos personagens como adequado, moderno e normal. A novela de Manoel Carlos é a receita para o fracasso de uma sociedade que tem (ou já teve?) na família o seu mais firme alicerce. Viver a vida, de verdade, é muito mais do que isso. Tô certo ou tô errado?


Leitura recomendada


* Não deixe de ler o brilhante artigo de Rodolfo Araújo onde ele explora o Princípio da Aceitação Social “(…)todo mundo gosta de se sentir integrado à sua comunidade, ou de pertencer a algum grupo. Suas atitudes deverão, sempre que possível, refletir esse sentimento e essa necessidade“.

** Leia também o livro Família Acima de Tudo, onde Stephen Kanitz fala sobre a importância da família.


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Leandro é Mestre em Administração pela Universidade Federaldo Rio Grande do Sul, certificado em Empreendedorismo pela Harvard Business SchoolUFPB. Tem MBA Internacional em Marketing, pelo IPAM – Instituto Português de Administração e Marketing e é bacharel em Direito pelo UNIPÊ. Foi professor da Escola de Administração da UFRGS. Criador e Editor do Portal Administradores.com.br, principal veículo on-line voltado à Administração de Empresas.

Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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3 comentários:

  1. Eu sempre afirmei, e isso gera críticas dentro da minha própria família, que as novelas da GLOBO, exceção feita apenas às de época e minisséries como “A Casa das Sete Mulheres”, “JK”, “Chiquinha Gonzaga”, “O Auto da Compadecida”, “Anos Dourados”, entre dezenas de outras, plantam nos corações e mentes do jovem brasileiro, principalmente, uma idéia distorcida e inteiramente divorciada dos conceitos que sempre sustentaram a família brasileira.

    A criatividade purpurinizada de alguns ícones da dramaturgia global, sem nenhum senso, pinta na tela da emissora uma realidade completamente deturpada e muito além de uma ficção social aceitável, principalmente no relacionamento homem/mulher, situação flagrante na novela “VIVER A VIDA”, onde o seu criador usa de todos os subterfúgios “para provar que trair é algo normal, que todo mundo trai todo mundo e não há nada reprovável nisso. Pelo contrário: é até algo bonito, poético. As puladas de cerca ocorrem sempre com o belíssimo pano de fundo da cidade maravilhosa ao entardecer, do alto de uma asa delta, ou nas areias paradisíacas de Búzios, ao som de uma belíssima trilha sonora. Sei lá, sei lá…”

    No site www.titnet.com.br, numa postagem datada de 27 de agosto de 2009, MANOEL CARLOS já prometia polêmica em "VIVER A VIDA", até porque ele escalou a jovem KLARA CASTANHO, 8 anos, como a grande vilã da história.

    - “Klara é a vilãzinha da novela e vai induzir a mãe (Dora, vivida por Giovanna Antonelli) a fazer coisas erradas", afirmou.

    Com comerciais em seu currículo, além da novela "Revelação", do SBT, KLARA será RAFAELA.

    - Ela vai aprontar bastante, mas não posso contar nada porque é segredo”, faz mistério a atriz mirim. A menina deve ajudar a mãe a separar os protagonistas HELENA (Taís Araújo) e MARCOS (José Mayer).

    SIRO DARLAN, desembargador da 7ª Câmara Criminal do Rio e membro do Conselho Estadual dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes, afirma que não é comum ver crianças como vilãs.

    - "Uma novela retrata fatos do mundo real e pode influenciar o comportamento de outras crianças, além de prejudicar a própria intérprete", diz ele, que em 2000 proibiu crianças na novela "LAÇPOS DE FAMÍLIA", do mesmo autor de “VIVER A VIDA”.

    Aliás, a atuação de CLARA CASTANHO, a menina “RAFAELA”, que na minha opinião é um fenômeno como atriz, já superou, há muito, os limites imagináveis para uma personagem de sua idade. Ela não existiria, quer na ficção, quer na realidade, se não fosse o texto que lhe é entregue pelos adultos “responsáveis” pelo folhetim!

    Acorda, SIRO DARLAN...

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  2. O texto é muito bom. Concordo plenamente com o comentário do Carlos Roberto quando ele afirma que as novelas da Globo passam, principalmente aos jovens, uma idéia deturpada do que é a realidade da vida, desmonstando ainda mais a idéia da família.

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  3. Eu também acho, como está no texto, que a Rede Globo dita moda através de suas novelas, e a mensagem de suas novelas é de promiscuidade, o que não é bom, principalmente quando se sabe que do outro lado estão jovens nem sempre preparados para por em prática as lições dos folhetins.

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