Pode parecer brincadeira, mas o Rio de Janeiro, justamente a cidade que vai sediar em julho deste ano a Rio+20, conferência da Organização das Nações Unidas - ONU sobre desenvolvimento sustentável, recicla apenas 3% de seu lixo, cerca de 252 toneladas das 8.403 geradas diariamente), e a empresa responsável pela coleta, a Comlurb, tem participação quase nula nesse percentual, já que dos 3% reciclados ela só separa 0,27, o que equivale a 22,68 toneladas. Os outros 2,73% ficam a cargo de catadores autônomos ou de cooperativas.
Essa realidade fica mais vergonhosa quando se sabe que há 20 anos atrás o Rio foi sede da Conferência Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ficou conhecida como Eco-92, o maior encontro sobre questões ambientais da história.
Com isso, jogamos no lixo a oportunidade de nos igualarmos a grandes metrópoles como Berlim (Alemanha) e Tóquio (Japão), famosas por não desperdiçarem seus recursos naturais, como já ocorre nas capitais europeias, que recuperam, em média, 40% de seus resíduos.
Os motivos desse desleixo insustentável são muitos, mas um deles, talvez o principal, está na vontade política que simplesmente não existe. Em 2002, a cidade implantou um sistema de coleta seletiva que até hoje não mostrou a que veio, já que pouquíssimos cariocas têm o privilégio de ver passar um caminhão de reciclagem da Comlurb na sua porta. Dos 160 bairros da cidade, acredite, apenas 41 são atendidos semanalmente, e, mesmo assim, de forma precária, já que por falta de investimentos, a coleta só ocorre em algumas ruas. Hoje, ela apresenta um desequilíbrio entre as áreas do Rio. Está mais presente nas zonas Sul (40%) e Oeste (42%) e bem menos na Norte (18%). Além disso, segundo a Comlurb, não existe coleta seletiva em favelas, o que exclui da conta um contingente de cerca de um milhão de pessoas.
Sérgio Besserman, presidente da Câmara Técnica de Desenvolvimento Sustentável do município, diz que "a Comlurb nunca promoveu uma campanha para que a população faça a separação de seu lixo", opinião que é endossada pela própria presidente da companhia, Angela Fonti.
- A primeira causa é a própria falta de uma campanha maciça em prol da reciclagem, algo que faremos com recursos do BNDES. A nossa coleta precisa ser bem mais abrangente também. A maioria das pessoas quer reciclar seu lixo, mas nossos caminhões não passam em boa parte das ruas. E precisamos tornar o mercado legal. Às vezes, moradores de um prédio separam seu lixo e, quando o nosso caminhão passa para pegá-lo, o lixo reciclável já foi roubado. Os atravessadores ilegais precisam ser eliminados - diz Angela.
Ela também afirma que as empresas precisam se engajar nesse processo, como determina a Política Nacional de Resíduos Sólidos, envolvimento que pode melhorar com a adoção de medidas simples:
- Nosso cronograma inclui pegar o lixo orgânico e reciclável dentro das casas e dos prédios. Os galpões vão melhorar as condições de trabalho e dar um fim aos atravessadores, que diminuem o ganho dos catadores.
Os galpões referidos por Angela Fonti estão previstos num acordo assinado no ano passado entre o município do Rio de Janeiro e o BNDES, onde está prevista a aplicação de R$ 50 milhões para a construção de seis galpões de triagem de materiais recicláveis, com a prefeitura colocando 15 caminhões em circulação, o que deverá expandir o serviço dos atuais 41 para os 120 bairros cariocas. Se tudo der certo, a coleta seletiva deverá ser ampliada em cerca de 2%, elevando para 5% o percentual de reciclagem na capital, o que convenhamos, ainda é muito pouco.
Na verdade, precisamos nos conscientizar da necessidade de reciclar nossos resíduos, mas é preciso que os três níveis de governo atuem com investimentos maciços. Sem a colaboração popular e os subsídios oficiais nunca chegaremos a nada em termos de sustentabilidade. Não existe mágica. O governo alemão gasta cerca de 5 bilhões de euros por ano para fazer o seu sistema de reciclagem funcionar. Estaremos dispostos a fazer o mesmo? Não é o que deixou transparecer a advogada Leonor Amaral, moradora da Praça Seca, em Jacarepaguá, quando perguntada sobre o assunto:
- Há quatro anos, o caminhão chegava à nossa rua, e os vizinhos, ao verem esse serviço, também se animaram. Começou a faltar e passou a vir só de vez em quando, até desaparecer por completo em dezembro do ano passado. Liguei para a Comlurb, e me informaram que estavam à espera de recursos para reimplantar o serviço em algumas ruas e expandi-lo. Mas o próprio funcionário da ouvidoria me disse que a coleta seletiva é o patinho feio.
Qual a sua opinião sobre o tema? Você participaria de um sistema de coleta seletiva? Uma campanha de conscientização seria importante?
Fonte: O Globo
Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral. |