Essa história tem três atos, e ao final dela você vai descobrir o valor que o Brasil e algumas pessoas, principalmente políticos, dão a Darcy Ribeiro, um dos mais notórios intelectuais que o Brasil já teve, autor de obras traduzidas para os idiomas inglês, alemão, espanhol, francês, italiano, hebraico, húngaro e o checo.
Primeiro ato
Segundo noticiário da época (janeiro de 2009), a antiga casa de veraneio de Darcy Ribeiro, localizada em Cordeirinho – Maricá - RJ, no final da rua 119, bem juntinho à praia, seria transformada em Centro Cultural.
A Casa de Darcy Ribeiro foi projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer e os traços futuristas característicos do arquiteto são marcantes, "a olhos vistos". A casa é pequena mas o espaço poderá ser melhorado sem ofender as linhas arquitetônicas do autor do projeto. O governo municipal, representado pelo prefeito Washington Quaquá e pelo secretário de cultura Sady Bianchin, já estariam, inclusive, iniciando obras de melhorias na rua 119, mostrando que em breve o objetivo seria alcançado, até porque contavam com parcerias junto a iniciativa privada.
A Fundação Darcy Ribeiro, representada pelo sobrinho de Darcy, Paulo Ribeiro, faria a cessão do imóvel por comodato, tudo porque ele era mais do que um veranista em Maricá, pois amava o município e suas praias, onde terminou de escrever dois livros: O Povo Brasileiro e Diários Indios. Nas gestões do ex-governador Leonel Brizola, Darcy Ribeiro foi o responsável para a construção do CIEP no Centro de Maricá, tendo ao seu lado Tatiana Memória, outra ilustre participante do governo Brizola.
Segundo ato
No dia 27 de fevereiro de 2009, o prefeito de Maricá, Washington Quaquá (PT), reuniu-se com o presidente da Fundação Darcy Ribeiro, Paulo Ribeiro, para a assinatura do comodato da Casa Darcy Ribeiro. Durante a audiência foi formalizada a doação para o município de Maricá, do imóvel situado na rua 119, em Cordeirinho, onde residiu o senador Darcy Ribeiro.
Paulo Ribeiro, sobrinho de Darcy, e Washington Quaquá, prefeito de Maricá |
De acordo com o contrato, a administração do imóvel passaria para a prefeitura, que seria apoiada pela Fundação.
- Estamos passando a casa para a prefeitura, em comodato por cinco anos. Vamos elaborar, junto à Casa de Cultura e a própria prefeitura, um projeto para transformar a Casa Darcy Ribeiro, em um Centro Cultural, onde serão realizadas exposições, lançamentos de livros e outros eventos, além de uma exposição permanente de Darcy, que era um grande defensor da Igualdade Social – explicou Paulo Ribeiro, que, além de presidente da Fundação, é sobrinho do Darcy.
- O nosso grande objetivo é dar seguimento ao pensamento de Darcy. A casa é parte do resgate das idéias de Darcy. Temos um compromisso intelectual e político com o passado. Não podemos deixar o passado morrer. Transformaremos o imóvel, que foi projetado pelo Oscar Niemeyer, no Centro Cultural Casa Darcy Ribeiro – concluiu Quaquá.
Terceiro ato
Em 13 de fevereiro de 2011, Mariana Filgueiras escreve na Revista, do O Globo:
“Em 1995, durante o tratamento contra um câncer no pulmão (que chamava de “bolinha”), o antropólogo Darcy Ribeiro fugiu do Hospital Samaritano, no Rio, deixando os médicos loucos. Decidiu passar os últimos dias na bucólica praia de Cordeirinho, em Maricá, onde tinha uma paixão: a casa em formato de oca projetada pelo amigo Oscar Niemeyer. Lá ainda viveria por mais dois anos, e escreveria, deitado numa rede, o livro “O povo brasileiro”. Hoje, 14 anos depois de sua morte, a casa virou uma indigesta metáfora desta mesma nação: um descaso à beira de um paraíso. A relíquia arquitetônica deveria ter sido transformada no Centro Cultural Darcy Ribeiro pela Prefeitura de Maricá, em 2009, mas está completamente abandonada e destruída.
O imóvel, na época de Darcy Ribeiro |
Centro Cultural Darcy Ribeiro hoje (foto: Gustavo Pellizon) |
Paredes estão carcomidas pela maresia, portas e armários foram saqueados por invasores. O teto da garagem ameaça cair e foi escorado por um vizinho. O que sobrou do telhado veio abaixo numa tempestade em 26 de outubro – dia em que Darcy faria aniversário. As vigas e fundações estão à mostra, tornando o cenário desolador e perigoso. A piscina e as bromélias do jardim viraram focos de dengue. Sem trincos ou janelas, ali entra quem quiser.
- Vem muito turista perguntar se é aqui mesmo a casa do Darcy Ribeiro, e fico até com vergonha de confirmar – ressalta uma vizinha que não quis se identificar.
- Acho uma tristeza, olho e ainda o vejo lendo na rede. Ele ficaria arrasado se visse a casa assim...”
Só pra que você tenha uma idéia da importância do nome Darcy Ribeiro, a gente relaciona abaixo as suas obras:
Etnologia
- Culturas e línguas indígenas do Brasil – 1957
- Arte plumária dos índios Kaapo – 1957
- A política indigenista brasileira – 1962
- Os índios e a civilização – 1970
- Uira sai, à procura de Deus – 1974
- Configurações histórico-culturais dos povos americanos – 1975
- Suma etnológica brasileira – 1986 (colaboração; três volumes)
- Diários índios – os urubus-kaapor – 1996, Companhia das Letras
Antropologia
- O processo civilizatório – etapas da evolução sócio-cultural – 1968
- As Américas e a civilização – processo de formação e causas do desenvolvimento cultural desigual dos povos americanos – 1970
- O dilema da América Latina – estruturas do poder e forças insurgentes – 1978
- Os brasileiros – teoria do Brasil – 1972
- Os índios e a civilização – a integração das populações indígenas no Brasil moderno – 1970
- The culture – historical configurations of the American peoples – 1970 (edição brasileira em 1975)
- O povo brasileiro - a formação e o sentido do Brasil - 1995
Romances
- Maíra - 1976
- O mulo - 1981
- Utopia selvagem – 1982
- Migo – 1988
Ensaios
- Kadiwéu – ensaios etnológicos sobre o saber, o azar e a beleza – 1950
- Configurações histórico-culturais dos povos americanos – 1975
- Sobre o óbvio - ensaios insólitos – 1979
- Aos trancos e barrancos – como o Brasil deu no que deu – 1985
- América Latina: a pátria grande – 1986
- Testemunho – 1990
- A fundação do Brasil – 1500/1700 – 1992 (colaboração)
- O Brasil como problema – 1995
- Noções de coisas – 1995
Educação
- Plano orientador da Universidade de Brasília – 1962
- A universidade necessária – 1969
- Propuestas – acerca da la renovación – 1970
- Université des Sciences Humaines d'Alger – 1972
- La universidad peruana – 1974
- UnB – invenção e descaminho – 1978
- Nossa escola é uma calamidade – 1984
- Universidade do terceiro milênio – plano orientador da Universidade Estadual do Norte Fluminense – 1993
Darcy Ribeiro foi eleito em 08 de outubro de 1992 para a cadeira 11, da Academia Brasileira de Letras, tendo como patrono Fagundes Varela, sendo recebido a 15 de abril de 1993, por Cândido Mendes. Curiosamente, ele registrou em seu discurso de posse:
"Confesso que me dá certo tremor d'alma o pensamento inevitável de que, com uns meses, uns anos mais, algum sucessor meu, também vergando nossa veste talar, aqui estará, hirto, no cumprimento do mesmo rito para me recordar. Vendo projetivamente a fila infindável deles, que se sucederão, me louvando, até o fim do mundo, antecipo aqui meu agradecimento a todos. Muito obrigado.
Estou certo de que alguém, neste resto de século, falará de mim, lendo uma página, página e meia. Os seguintes menos e menos. Só espero que nenhum falte ao sacro dever de enunciar meu nome. Nisto consistirá minha imortalidade".
O seu nome, Darcy Ribeiro, continuará sendo lembrado por pessoas como nós, que sempre valorizamos o seu trabalho, mesmo que nossas posições políticas não tenham sido as mesmas, o que é próprio do regime democrático. Isso vai garantir a sua imortalidade, tenho certeza!
O problema está na utilidade da pequena parte do seu patrimônio que foi doada à municipalidade de Maricá - RJ em nome da cultura. Nesse caso, infelizmente, tudo leva a crer que você está fadado ao esquecimento!
Fontes: Noticiário RJ online e Wikipédia
Sobre o Autor:
Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral. |
Conheço pouco sobre ele, mas foi ele quem abriu precedentes para criação de ideias que visam a anti-racialização do Brasil, afirmando que somos mestiços e não há como nos dividir em raças. É isso mesmo, né?
ResponderExcluirQualquer coisa, Wikipédia nele rsrsrs
É isso aí, Kiara!
ResponderExcluirAliás, tenho essa frase guardada comigo desde que comprei o meu primeiro PC, há quase 20 anos:
"Nós, brasileiros, somos um povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos nos fazendo. Essa massa de nativos viveu por séculos sem consciência de si...
Assim foi até se definir como uma nova identidade étnico-nacional, a de brasileiros..."
Gênio, não?
Um grande pensador de nosso tempo, mas conseguia observar o futuro bem a frente de nosso tempo.
ResponderExcluirCom certeza, Palacios!
ResponderExcluirEle era um sujeito além do nosso tempo, uma inteligência privilegiada.
Um abração...
Suas matérias no blog são bem interessantes, e acho que seria bacana também você divulgá-las no www.plik.com.br, porque lá, basta colocar um título, adicionar uma pequena frase ou texto sobre o assunto, e logo após o texto, o link do artigo completo (como complemento, pode informar tags abaixo).
ResponderExcluirAssim que postar, este resumo com link para seu artigo já fica na página inicial do Plik, e o Google indexa o Plik várias horas do dia, todos os dias, ou seja, você vai ter mais "votos" (links de outros sites) apontando para seu site, e isso com o passar das semanas, vai ajudar no crescimento do seu blog!
Se quiser, pode acessar agora: www.plik.com.br, e para usar o site, pode criar sua conta grátis ou se logar via Twitter ou Facebook, ou seja, muito prático e fácil participar.
Espero que goste da dica.
Abraço!
Fernanda
Valeu, Fernanda!
ResponderExcluirJá estou postando meus posts no Plik!
Um abração...
Só tenho uma palavra: vergonha.
ResponderExcluirInfelizmente, Dorly, poucos compactuam do seu sentimento. A sociedade brasileira parece não se importar com fatos dessa natureza. Aqui se dá muito valor a futebol, carnaval, BBB e pouquissima atenção aos problemas mais sérios, como a educação e a cultura, por exemplo.
ResponderExcluirPor isso é tão importante opiniões como a sua!
Um grande abraço...
Triste e desalentador. Um povo que foi tão elogiado e admirado pelo Darcy. Hoje fiz em meu blog uma pequena homenagem e tenho certeza que ele não será esquecido. Se puder me faça uma visita.
ResponderExcluirhttp://pensamentosduneto.blogspot.com/
Um abraço!
É verdade, Eduardo!
ResponderExcluirO problema é que o povo brasileiro tem memória curta e pouquíssima cultura. É isso que leva ao poder políticos fisiológicos como os referidos na postagem. Esse é um retrato em 3x4 do Brasil!
Um abração...