24 outubro 2011

Varas de Família que atendem mulheres carentes estão sendo extintas

Você lembra das polêmicas que a Secretaria de Políticas para as Mulheres, da Presidência da República, criou com Gisele Bündchen e os personagens Valéria e Janete, do Zorra Total, além de Baltazar e Celeste, de Fina Estampa, da grade de programação da Globo?

Então preste atenção nesta história. Na última quarta-feira (19/10), depois de esperar por sete longos anos, a assistente de saúde N., de 44 anos, foi à Defensoria Pública do Rio de Janeiro para desistir da execução de alimentos movida contra o ex-marido. Ela foi praticamente obrigada a abrir mão de um direito líquido e certo depois de tanta espera e humilhações. Tanto quanto ela, outras mulheres também buscavam informações de servidores que tentavam explicar algo que ninguém consegue entender.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, desde 2008, vem reduzindo o número de varas de família da capital. Cinco já foram extintas, e agora em novembro, outra fechará as portas, transferindo todo o acervo processual para as outras serventias.

As leis brasileiras podem não ser as melhores, mas têm garantido avanços importantes na área dos direitos de família, como a união estável, o divórcio extrajudicial e a união homoafetiva, que igualam o Brasil a alguns dos países mais desenvolvidos do planeta, mas a Justiça parece estar alheia a esse acontecimento. A decisão de acabar gradualmente com as varas de família, se não veda, prejudica sobremaneira o acesso de mães solteiras e pobres à justiça gratuita, impedindo que elas reivindiquem direitos como pensões alimentícias e o reconhecimento de paternidade de seus filhos.

Advogados, defensores públicos e até promotores de justiça se uniram contra a decisão do Judiciário fluminense. Jorge Otávio Gonzaga Reis, por exemplo, que é coordenador da área cível do Escritório Modelo da Universidade do Estado Rio de Janeiro - UERJ, faz uma grave acusação:

- A questão é financeira. As varas de família, procuradas por gente pobre, estão sendo substituídas por varas cíveis ou varas de fazenda, que são mais rentáveis.

E ele não está sozinho em sua tese. A defensora pública Karla Beatrice Merten, lotada na 6ª Vara de Família, concorda com o colega advogado. Segundo ela, o valor de uma causa em sua área fica em torno de R$ 1,2 mil. A taxa judiciária que ela rende (exatos 2%) é irrisória em relação ao custo de ações muitas vezes milionárias que tramitam nas Justiças Cíveis e de Fazenda Pública.

- É um erro dizer que o movimento da Justiça de família está caindo. Muito pelo contrário. Hoje, existem ações onde já se discute até a quem caberá a guarda do animal doméstico - sustentou a defensora pública.

Jorge Otávio diz ainda que a lei que autoriza o divórcio em cartórios extrajudiciais, quando o casal não tem filhos menores, não irá reduzir o movimento nas varas de família, já que a maioria das pessoas que enfrentam o problema não pode pagar as custas do processo:

- Uma separação extrajudicial custa em torno de R$ 800. Na Mangueira ou em Manguinhos, onde vive a maior parte de nossa clientela, ninguém tem dinheiro para isso. Então, a única saída continua sendo a Justiça. Até porque dificilmente os cartórios privados abrem mão das taxas.

Aí eu me lembrei da dona Iriny Lopes, a ministra da tal Secretaria de Políticas para as Mulheres, da Presidência da República, e algumas perguntas me vieram à cabeça. Por quê ela, tão empenhada na defesa de políticas para a mulher, não interpela, pelos caminhos legais, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sobre o assunto? Ou será que o problema de mulheres pobres que necessitam de assistência jurídica gratuita não interessa ao órgão que ela dirige? Eu, particularmente, acho que a Gisele e a Hope; a Valéria e a Janete, do Zorra Total, e o Baltazar e a Celeste, de Fina Estampa dão mais Ibope. E você, o que pensa disso?


Fonte: O Globo



Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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