02 abril 2011

Conselho Nacional de Justiça quer que Judiciário trabalhe mais

Sempre que alguém tenta interferir em alguns sistemas atuantes no país, o bicho pega, principalmente se objetivo da mexida estiver relacionado às vantagens auferidas por seus membros. É o caso do Judiciário!

Na última quinta-feira (31/03), o Conselho Nacional de Justiça – CNJ aprovou um novo horário de atendimento ao público para todos os tribunais do país – das 9h às 18h, no mínimo – o que provocou a ira de servidores e magistrados, que se a determinação for cumprida, terão de trabalhar por mais tempo. A página da Federação Nacional dos Servidores do Judiciário nos Estados – Fenajud, por exemplo, já está repleta de queixas.


Numa delas, desabafa e ameaça um servidor:

- A Lei Áurea há tempos foi revogada, vamos nos organizar e parar o Judiciário do país, não agüentamos mais essa intromissão em desfavor dos servidores.

Em nota divulgada na mesma quinta-feira (31/03), a Fenajud alega que a decisão do CNJ pode afetar os direitos de servidores que trabalham 7 ou 6 horas corridas. Segundo a entidade, 11 estados adotam jornada de 6 horas, e 12, de 7 horas corridas.

A entidade de classe sustenta, ainda, que por falta de pessoal, o cumprimento da determinação do CNJ ampliará a jornada de trabalho dos servidores, que atualmente é de 6 ou 7 horas diárias.

- Fica-nos a preocupação de (saber) em que termos será efetivamente garantido esse horário com a escassez de servidores nas unidades cartorárias. Terão os tribunais condições de suprir as unidades judiciais sem prejudicar a jornada de trabalho dos servidores? - questiona o texto.

O órgão defende a jornada de trabalho reduzida:

- A redução da jornada de trabalho, além de ser beneficamente melhor no aspecto da saúde do trabalhador (aqui incluído o magistrado que também é trabalhador), por outro lado oportuniza que os trabalhadores fiquem mais tempo com sua família e/ou possam se qualificar através de graduações ou especializações.

Ainda de acordo com a Fenajud, dos 26 Estados da Federação, em 11 os trabalhadores dos tribunais têm jornada de 6 horas em turno único (pela manhã ou pela tarde), e em 12, entre eles o Rio de Janeiro – RJ, a jornada é de 7 horas. Em apenas 3 Estados a jornada é de 8 horas diárias.

A seu turno, o presidente do Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais de Justiça, desembargador Marcus Faver, disse nesta sexta-feira que vai reunir o colegiado para discutir o assunto e, se for o caso, pedir para o CNJ rever a determinação. Ele chegou a alegar até que o calor, no caso do Norte e do Nordeste, impede o trabalho no expediente que o CNJ ordenou.

Faver argumentou que, em alguns estados, leis locais garantem a jornada de seis horas diárias. Por isso, disse, seria necessária a contratação de mais funcionários ou o pagamento de horas extras para o servidor esticar o expediente. Segundo ele, não há recursos disponíveis para pôr em prática nenhuma das soluções:

- Em alguns estados os servidores públicos têm um horário de seis horas. Como ter dinheiro para pagar as horas de diferença? Para fazer revezamento, precisa de dois funcionários realizando a mesma função. Complica no orçamento dos tribunais, que não têm verba para pagar mais funcionários.

Hoje, alguns tribunais, especialmente os do Norte e do Nordeste, funcionam apenas de manhã. O desembargador argumentou que, nesses locais, é tradição o expediente mais cedo, devido ao calor.

- Há estados no Norte e no Nordeste que têm o costume de anos, em razão do calor, de começar seus expedientes às 7h. Eles têm o costume de fazer a sesta em razão do calor também. Isso é um costume tradicional nessas regiões e que tem suas razões de ser. É complicado, no calor, você respeitar o horário estabelecido - disse. - O ideal seria que a gente pudesse ter uma legislação uniforme. Mas é um risco você desrespeitar as tradições locais. O Piauí tem um calor intenso de 12h às 15h, é quase impraticável trabalhar - disse ele, que só esqueceu de mencionar que os tribunais geralmente têm sistemas de ar-condicionado pagos exatamente pelo contribuinte que não a prestação jurisdicional a que tem direito.

Já o juiz federal Walter Nunes, conselheiro do CNJ encarregado de relatar a polêmica decisão, disse que a jornada de trabalho dos servidores será mantida, esclarecendo que será preciso fazer um revezamento entre os funcionários para garantir a prestação de serviço no horário determinado, que segundo ele, deverá valer para todos os setores dos tribunais, varas, gabinetes e protocolos. Nunes também não na acredita na alegada falta de servidores para cumprir a determinação.

- A impressão que nós temos é que não (faltam funcionários nos tribunais). É razoável o Judiciário trabalhar só de manhã ou só de tarde? Não é. Até pela quantidade de serviço que existe. Se o Judiciário não funcionar de manhã ou de tarde, como é que a gente vai ver os processos julgados? - questionou o conselheiro.

Como se pode ver, para justificar a manutenção do tratamento diferenciado, os argumentos vão desde a tradição da “sesta em razão do calor” defendida pelo desembargador Marcus Faver, presidente do Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais de Justiça, até a possibilidade de “que os trabalhadores fiquem mais tempo com sua família”, valentemente sustentada pelo membro do Fenajud. Que coisa meiga, não? Por que é que algumas classes se acham privilegiadas em relação ao restante da massa trabalhadora brasileira? Por que nem todos têm direito à “sesta” ou “mais tempo com sua família”?

Aliás, a medida agora adotada pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, quem quiser pode conferir, já foi motivo de discussão aqui no Dando Pitacos (basta ler Justiça: além de cega, preguiçosa e É hora de Innovare), onde sempre defendemos a tese de que para funcionar melhor, o Judiciário precisa é trabalhar mais, fazendo jus, aliás, aos belos e polpudos salários que recebem serventuários e magistrados. Qual é a sua opinião sobre o assunto?


Fonte: O Globo



Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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