18 janeiro 2012

Associação compara juízes a Tiradentes, o herói da Inconfidência Mineira

Tiradentes esquartejado
Obra de Pedro Américo (1893)
Apesar de séria, a briga entre a Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB e o Conselho Nacional de Justiça - CNJ em torno da quebra de sigilo de membros do Judiciário está deixando a área do Direito e entrando no campo do ridículo e da famosa teoria da conspiração. Certamente por falta de argumentação mais robusta e inteligente, o presidente da AMB agora anda vendo uma "facção criminosa" por trás da campanha contra os magistrados, comparados por ele, pasmem, a Tiradentes. De acordo com a tese por ele desenvolvida, os recentes ataques à credibilidade da magistratura brasileira não são meras coincidências.

- Eu não tenho dúvida disso. Vivemos num país onde quatro juízes e dois promotores foram assassinados recentemente e, em menos de um mês e meio, presenciamos quatro ataques contra fóruns. Pelos meus 30 anos de experiência, posso dizer que esses ataques conjuntos não são coincidência - ressalta Calandra, acrescentando:

- Há mobilizações de organizações criminosas em vários estados se especializando em acusar magistrados de corrupção, tudo para bloquear a ação da justiça criminal. Isso já aconteceu no Goiás e no Pará.

A reforçar esta teoria há o fato de só agora estarem sendo divulgadas movimentações financeiras atípicas realizadas em tribunais do país há cerca de 10 anos, o que não tem fundamento, já que os dados foram solicitados ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Ministério da Justiça em julho de 2009 pelo ministro Gilson Dipp e só chegaram ao Conselho Nacional de Justiça em fevereiro de 2011, quando Eliana Calmon já ocupava o cargo de Corregedora.

Apenas para relembrar, o relatório do Coaf revelou que, entre os anos de 2000 e 2010, 3.426 magistrados e servidores do Judiciário fizeram movimentações consideradas "atípicas" no valor de R$ 855 milhões. Além disso, em 2002, uma única pessoa do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro teria sido responsável por 16 movimentações financeiras no valor total de R$ 282,9 milhões. Em 2008, outras duas pessoas do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo e uma do Tribunal de Justiça da Bahia também teriam movimentado R$ 116,5 milhões de forma atípica. As maiores irregularidades estão concentradas nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Paraíba, Minas Gerais, Distrito Federal, Espírito Santo e Roraima.

O Poder Judiciário, mais que qualquer dos poderes da República, não pode permitir dúvidas sobre a conduta ética e moral de seus membros. A simples suspeita de que servidores públicos, mas principalmente magistrados, possam estar envolvidos em movimentações financeiras aparentemente inexplicáveis causa perplexidade ao cidadão e semeia a ideia de impunidade. Quem paga o salário do magistrado, como de todo e qualquer funcionário público, somos nós, o povo, e por isso temos o direito de saber a verdade acerca dos fatos noticiados, e eles, apesar do esperneio, a obrigação de informar, o que não é um favor, mas consequência decorrente de mandamento constitucional.

A defesa do sigilo fiscal defendida por Nelson Calandra é tão ridícula que ele, à falta de melhor argumento acabou se saindo com essa verdadeira pérola:

- Foi com base em pretensas irregularidades tributárias que o corpo de um brasileiro foi partido e espalhado por uma cidade para servir de exemplo aos outros - disse o presidente da AMB, comparando os magistrados a Tiradentes, o herói da Inconfidência Mineira.

Atitudes bizarras como essa só fazem alimentar uma discussão que já teria terminado se as cartas fossem postas na mesa. Não há nenhuma campanha contra o Judiciário, e a imagem dos juízes está sendo arranhada exatamente em razão da injustificada defesa do sigilo bancário, não de toda a classe, mas dos funcionários e magistrados apontados no relatório do Coaf. Se houvesse mais transparência e menos corporativismo, não haveria crise. Afinal, quem não deve não teme! Ou será que é o contrário?



Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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