09 agosto 2011

A choradeira dos juízes

Em entrevista dada ao jornal O Globo (28/07), Cesar Peluso, ministro presidente do Supremo Tribunal Federal - STF, defendeu a "equiparação" do descanso dos juízes ao de todos os assalariados brasileiros, conforme previsto nas leis trabalhistas em vigor. Como não poderia deixar de ser, a reação da categoria foi imediata, e as notas distribuídas por suas associações é, no mínimo, ridícula.

A Associação dos Juízes Federais - AJUFE e a Associação dos Magistrados do Brasil - AMB divulgaram notas defendendo as férias de 60 dias para juízes. As entidades sustentam que a maioria dos magistrados se opõe à redução do descanso, sustentando que eles não têm jornada fixa semanal de trabalho, que superaria 40 horas semanais, e não recebem horas extras pelo excesso de trabalho, e além disso, a alteração do período de férias da categoria dependeria da aprovação do Congresso Nacional.

O presidente da AJUFE, Gabriel Wedy, argumenta que as férias de 60 dias são um direito fundamental para os juízes, pois é nesse período que eles analisam os processos mais complexos:

- Os juízes levam trabalho para final de semana e férias. É uma realidade que se impõe porque eles têm que atingir metas de produtividade impostas pelo CNJ - Conselho Nacional de Justiça - sustenta ele.

Seguindo o mesmo raciocínio, claro, o presidente da AMB, Nelson Calandra, disse em nota que é "justo" que os juízes gozem de 60 dias de férias, período por eles aproveitado para colocar o trabalho em dia.

- Juízes não têm hora para começar e terminar o trabalho. Sua jornada de trabalho é superior a 60 horas semanais, trabalham durante os finais de semana e feriados, sem qualquer compensação financeira. Na maioria das vezes, suas férias são dedicadas a colocar o trabalho em dia, de forma mais ágil já que, nesse período, não têm que fazer atendimento público nem audiências - afirma Calandra.

Afirma ainda a AMB que os "60 dias são uma questão de saúde ocupacional, como forma até de evitar aposentadorias por invalidez e perdas precoces de vidas em razão do esgotamento físico", o que seria uma grande piada se o assunto não fosse tão sério.

Sou advogado há 23 anos e posso afirmar que, pelo menos no Rio de Janeiro - RJ, onde a maioria dos juízes (principalmente nas comarcas do interior) só trabalha às terças, quartas e quintas-feiras (a partir das 13h ou 14h), a tal jornada de trabalho "superior a 60 horas semanais" é pura demagogia, história pra inglês ver.

Aliás, o tema horário de expediente dos juízes já foi objeto de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, determinando que todos os órgãos que integram o Judiciário prestassem atendimento ao público das 9h às 18h, de segunda a sexta-feira. A resolução foi suspensa pelo ministro Luiz Fux, também do STF, e agora o embróglio será julgado pelo plenário. Será que alguém tem dúvidas sobre o resultado do julgamento?

O presidente da AJUFE ponderou que, com a informatização dos processos, o juiz federal está "disponível à população 24h por dia". Logo a justiça federal, a pior instituição judiciária do país, onde um processo chega a esperar um despacho por cerca de 8 a 9 meses. Uma grande piada, e de muito mau gosto!

O grande problema da justiça brasileira, e isso já foi dito aqui algumas vezes (basta ler Justiça: além de cega, preguiçosa! e Conselho Nacional de Justiça quer que Judiciário trabalhe mais), é um só: não há interesse político. Justiça célere não interessa, principalmente aos governos e à classe política, os maiores infratores da lei. Por isso ninguém faz nada em termos de mudanças, e nesse passo, Legislativo e Judiciário, acostumados ao tratamento diferenciado, jamais aceitarão submeter-se aos padrões impostos ao cidadão comum. Aliás, a tentativa de equiparar os magistrados às classes subalternas do país, afirma Ruth de Aquino (revista Época - nº 689), "é uma maldade com os meritíssimos" já que "os juízes estão acostumados aos superlativos". E tudo começa pelos salários e benefícios, enormemente diferenciadas em relação ao restante da população.

Essa é, infelizmente, a realidade do Judiciário brasileiro. E que ninguém se iluda: enquanto a sociedade não se mobilizar, nada vai mudar. É claro que a igualdade nunca existirá, mas também não precisa ser calça de veludo ou joelho de fora. Suas excelências continuarão no Olimpo, isso nós já sabemos, mas algumas coisas precisam mudar: horário de trabalho e período de férias iguais já seria um bom começo.



Sobre o Autor:
Carlos Roberto Carlos Roberto de Oliveira é advogado estabelecido em Nova Iguaçu - RJ. A criação do Dando Pitacos foi a forma encontrada para entreter e discutir assuntos de interesse geral.

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